Aulas Transcritas de Processo Civil
terça-feira, março 15, 2005
 
Aula do dia 23.11.2004
.......foi a classificação geral, comentários de ordem mais doutrinária. Ficou faltando, então, observar o próprio texto do Código referente a litisconsórcio.
Vamos começar a fazer isso a partir do artigo 46.
Vamos observar que o caput do art. 46 quando dispõe acerca de litisconsórcio, digamos que nos oferece também uma definição de litisconsórcio. Porque nos diz o referido artigo que:
“Duas ou mais pessoas podem litigar num mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:”
Ou seja, aqui estamos diante do litisconsórcio facultativo na sua acepção estrita, ou o caput deste artigo pode nos servir como balizador de definição para litisconsórcio.
E aí nos vamos observar que o art. 46 segue com alguns incisos. Na verdade, esses incisos são um tanto quanto confusos, porque eu chego ao mesmo resultado apenas com a hipótese do inciso IV. Vamos analisar os respectivos incisos e verificar essa questão.
O inciso primeiro nos diz que é possível litigar em conjunto quando:
“I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;”
Quando eu tenho comunhão de direitos ou de obrigações? Quando um direito pertence a duas ou mais pessoas. Comunhão de direitos ou de obrigações se conclui que o direito que está sendo debatido na verdade é de titularidade de ambas as pessoas. Conseqüentemente isso vai envolver partes, causa de pedir e pedido. Nós vamos verificar a possibilidade desse litisconsórcio porque é uma razão bastante específica, uma razão que perpassa a própria titularidade e a individualização desses direitos. Nós temos aqui, então, um condomínio daquela determinada situação posta em juízo.
Essa situação mais cerrada vai se abrindo paulatinamente quando vão se sucedendo os incisos. Nos diz o inciso segundo que, quando:
“II - os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;”
Fundamento de fato e fundamento de direito. Vamos compreender um pouquinho melhor essas expressões.
Compreender o processo - isso eu repito sempre - é também e, em certa medida, compreendermos determinados padrões de definição. O processo apresenta algumas idéias básicas e repete essas idéias inúmeras vezes e de diversas formas. Mas o centro é o mesmo. Quando nós trabalhamos a idéia do art. 282, nós temos a necessidade de apresentarmos os fatos e os fundamentos. Ao mesmo tempo, quando estudamos na Teoria Geral do Processo, os elementos da ação, temos:
partes;
causa de pedir (próxima e remota);
pedido negado e pedido
Nos interessa aqui analisar a causa de pedir.












Nos elementos da ação, quando estudamos causa de pedir, falamos em causa de pedir próxima e remota, o que se liga nessa idéia do art. 282, com fatos e fundamentos. Por que? Vamos observar que fatos e fundamentos significam a causa remota (fatos) e a causa próxima (os fundamentos). Ou seja, as conseqüências jurídicas dos fatos. Esta idéia, então, de que temos que apresentar a causa próxima e a causa remota, vale dizer, os fatos e, em si, a seqüência de acontecimentos e atribuir a essa seqüência de acontecimentos as conseqüências jurídicas desses acontecimentos é uma exigência da inicial. Quando levamos isso para o litisconsórcio, este nos fala em fundamentos de fatos e fundamentos de direito. Ora, estou empregando uma outra linguagem, estou usando outras palavras para me referir à mesma coisa. Ou seja, se eu tiver fatos, ou se eu tiver fundamentos, na linguagem do art. 282, que sejam comuns e, conseqüentemente, sejam aptos a criar influência recíproca, vale dizer, que eu corra o risco de decisões contraditórias, é possível, então, com base nisso, a propositura de um litisconsórcio.
E o inciso III, de modo bastante estranho, acaba repetindo esta mesma idéia, porque nos diz que, quando:
“III - entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;”
Ora, quando falamos nos elementos da ação, chamamos também o pedido de objeto.E quando nos deparamos com o art. 103, vamos observar os aspectos ligados à conexão:
“Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir.”
Aqui é justamente o que nós temos a conexão pelo objeto ou pela causa de pedir. Vamos, para entender, relembrar a conexão. Nós temos um sistema processual que busca, não só aqui, mas em vários momentos do processo, evitar decisões contraditórias. Isso é uma constante ao longo desse conjunto de normas processuais. Nós vamos verificar isso não só no primeiro grau, mas vamos verificar isso no incidente de uniformização e jurisprudência; vamos observar isso na estrutura do recurso especial e do recurso extraordinário, que visam uma harmonização da jurisprudência, uma condensação de interpretação; vamos observar isso no fenômeno da autorização de súmulas por parte dos tribunais; ou seja, todo um conjunto processual visa a eliminação das interpretações das decisões contraditórias, porque estas enfraquecem o próprio Poder Judiciário. Ou seja, como o Poder Judiciário ele padece de legitimidade, como o Poder Judiciário não recebe nenhuma manisfestação popular de apoio, pois não tenho eleições no Poder Judiciário, é claro que ele padece de legitimidade. E uma das formas pelas quais se busca o incremento da credibilidade do Poder judiciário é justamente desenvolvendo mecanismos que venham a repelir as decisões contraditórias. Pois estas expõem de modo mais claro a própria fragilidade do sistema judiciário. Assim, a conexão é uma dessas questões, eu tenho que analisar a combinação dos elementos da ação; e aqui devemos lembrar que isso forma uma escala: se eu combino um dos elementos, eu tenho a conexão; se eu combino dois elementos eu tenho continência; se eu combino três elementos eu tenho a litispendência, no curso do processo ou posso formar o encerramento desse processo em função da coisa julgada, se o processo já tiver sido encerrado. Então, isso é uma escala de intensidade na combinação dos elementos da ação.
Na conexão eu combino a causa de pedir OU o pedido, eu não preciso de identidade de partes: basta que a causa de pedir OU o pedido sejam comuns. Ou seja, é necessário detectar, é necessário perceber a possibilidade de uma determinada ação influenciar no resultado de outra. Vamos observar que a leitura não pode ser uma leitura gramatical desse dispositivo, por...
- Professor, o sr. falou que na petição são duas coisas iguais, causa de pedir e pedido?
- OU: um OU outro. Ou causa de pedir OU pedido. Na continência é que eu preciso combinar todos os elementos. Na conexão é apenas um dos elementos.
Vamos observar o texto do art. 103:
“Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto OU a causa de pedir.”
- Não são as duas não? Na conexão não são as duas coisas que são iguais? Na continência o pedido é que é mais amplo?
Vamos repetir o teor do art. 103: “Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto OU a causa de pedir.” Vale dizer, basta que eu combine a causa de pedir ou que eu combine o pedido. Ou seja, eu estou combinando um dos elementos. Eu não preciso combinar os dois elementos, basta que eu combine UM desses elementos. Diferente da continência pois, aqui sim, eu vou combinar dois desses elementos. Na litispendência eu vou combinar os três. Então, enquanto que aqui eu tenho motivos para congregar as demandas, aqui tenho motivos para extinguir a demanda. O texto do art. 103 apresenta essa questão alternativa de modo relativamente claro. O problema do art. 103 é a impossibilidade de um interpretação gramatical no que se refere a essa reunião, porque se eu for interpretar gramaticalmente, qualquer causa que tenha por objeto, ou seja, que tenha como pedido uma indenização de danos morais, por exemplo, será conexa. Então, as milhares, e milhares e milhares de ações que se pede dano moral seriam todas elas conexas pelo objeto. É claro que esse não é o resultado esperado, esse não é o resultado desejaado. O que se quer? Detectar as hipóteses em que essa causa de pedir comum, ou esse pedido comum possam repercutir na respectiva demanda. A influência recíproca dessas demandas. Então, nós temos aí a reunião dessas causas como conseqüência, razão pela qual se eu posso reunir essas causas, alterando a competência pré-fixada, pré-determinada, essa é, também, uma razão pela qual eu posso formar litisconsórcio. Ou seja, ao invés de reunir em momento posterior essas demandas, já autorizamos desde já uma propositura em litisconsórcio dessas respectivas demandas, evitando, assim, os atos processuais de exceção de incompetência, possibilidade de recurso de uma exceção de incompetência, a possibilidade de conflito de competência que venha a surgir, conflito de competência positivo, conflito de competência negativo, conflito de competência misto. Então, nós vamos observar o que? A mesma razão que vai ensejar a reunião de causas na conexão é mesma razão que vai ensejar o litisconsórcio com base neste dispositivo. Daí porque nós temos que sempre verificar o processo desta maneira: as razões de um determinado sistema e a repetição dessas razões com outras formas, com outras nomenclaturas, com outros prazos, mas as idéias processuais, os padrões processuais se repetindo.
E não só aqui, vários outros seriam os exemplos. Apenas para sermos extremamente rápidos em exemplificar isso: o art. 282, é o artigo que nós dá o roteiro da petição inicial. A mesma idéia contida neste artigo se repete no art. 617; que se repete no art. 801, para o processo cautelar. São os artigos que determinam como devem ser organizadas as petições iniciais.
A idéia de condições da ação, por exemplo, e de pressupostos processuais ela é repetida no âmbito dos recursos com um novo nome que é juízo de admissibilidade, aonde nós verificamos os requisitos recursais. Alguns não chamam de requisitos, alguns chamam de pressupostos recursais. Mas a idéia dos requisitos ou dos pressupostos recursais é exatamente a mesma das condições da ação e pressupostos processuais. A divisão entre análise preliminar e análise de mérito é a mesma, tanto numa ação no primeiro grau como em sede recursal, daí porque falarmos em conhecer do recurso e dar provimento ao recurso, são expressões distintas. Apenas, rapidamente, podemos perceber a repetição de padrões que se estabelecem no processo. Nós temos a todo momento um conjunto muito pequeno de idéias e estas idéias são repetidas à exaustão ao longo de todo o sistema. Conhecer esse núcleo fundamental de idéias e como isso se comporta nos dá uma visão macro do processo. E isso é efetivamente bastante importante para uma compreensão mais abrangente.
Vamos observar o inciso IV, do art. 46. Na verdade os três incisos anteriores estariam de certo modo englobados pela idéia do inciso IV, porque este assim dispõe:
“IV - ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.”
Ou seja, afinidades de questões por um ponto comum. Aonde esse ponto comum? Nos diz o inciso: fato ou direito.
Estamos aqui mais uma vez diante de fato ou de direito. Toda essa idéia que já colocamos é um padrão que se repete: elementos da ação, partes, causa de pedir e pedir.
Vamos observar um ponto comum no fato ou no direito. Isso significa eu não preciso de uma inteireza de combinação na causa de pedir. Basta que eu tenha um fragmento, basta que eu tenha a parcela de afinidade ou na causa próxima, ou na causa remota. Eu não preciso sequer de uma inteireza em relação à causa próxima e causa remota. Basta que tenhamos um ponto em comum. Ora, isto é tão amplo que a idéia contida no inciso IV, por via de conseqüência, quase que absorve as idéias dos incisos anteriores. De modo que este artigo poderia ser bem mais enxuto, ele poderia ser bem mais seco, específico porque bastaria a apresentação dessa idéia que nós já estaríamos englobando a comunhão de direitos, já estaríamos englobando a hipótese do inciso II, onde as obrigações derivam de um mesmo fundamento. Ora, se eu posso ter o litisconsórcio com apenas a afinidade um ponto comum, que dirá com algo mais intenso que é o derivar de um mesmo fundamento de fato ou de direito? Apenas a questão que não estaria englobada pelo inciso IV seria a conexão pelo objeto, porque o referido inciso se refere em fatos e fundamentos, em fato e direito, à causa de pedir e não ao objeto.
-.......................
- O nosso grande problema é uma incapacidade de interpretação. Vamos dar um exemplo para tentar deixar isso claro. Nós tivemos uma reforma nos recursos em 1998, não é? Vamos pensar o seguinte: eu chego à instância de recurso sem a possibilidade de apelar. Quando eu ingresso aqui sem o habituado recolhimento de custas, o que nos diz o CPC? Que eu vou complementar essas custas. Essa era uma idéia presente no sistema, não era uma idéia estranha ao sistema, era uma idéia presente à estrutura processual. Pois bem, ao mesmo tempo, além dessa idéia aqui estar contida no CPC, nós vemos que este mesmo Código nos diz que o procedimento ordinário é subsidiário aos recursos, à execução, à cautelar e aos procedimentos especiais, sejam eles de jurisdição contenciosa, sejam de jurisdição voluntária. Isso também é uma idéia que está prevista na estrutura. Pois bem, quando o sujeito ingressa aqui com o recurso, se acontecesse aqui o mesmo problema que nós estamos nos referindo aqui, por uma questão hermenêutica, o desembargador fazia o aqui? Deserto o recurso. Vejam a nossa incapacidade de observação, vejam a nossa incapacidade de pensar o processo nessa sua repetição de padrões, que precisou vir uma lei para nos dizer o óbvio: olha, Excelência Desembargador, quando estiver faltando R$ 1,00, R$ 0,50, R$ 2,00 para o recurso, você tem que fazer como o seu colega da instância inferior: manda completar as custas. ...............Porque esse caminho, essa solução poderia ser implementada apenas através de uma visão hermenêutica, nós não precisávamos de lei para isso. E assim como essa, nós temos várias e várias outras questões no processo que poderiam ser resolvidas por mera interpretação, por mera análise dos textos e das correlações que existem. Vamos lembrar que o Código Civil da França tem duzentos anos. Lá eles não têm Código do Consumidor, no entanto eles têm proteção ao consumidor, por que? Porque a interpretação do vício redibitório, em diversos desdobramentos, a noção de boa fé nos contratos, já disposta no Código de Napoleão foi sendo ampliada, interpretada, verificada hermeneuticamente sem a necessidade de se produzir um Código de Defesa do Consumidor. Mas no Brasil temos um apego à norma legal tão intenso, uma visão meramente gramatical da norma tão enraizada que, na verdade, o legislador sempre prefere o quê? Detalhar, porque quando ele não faz o detalhamento, as conseqüências comumente são mais desastradas do que qualquer outra coisa. Então, me parece aí que a tentativa, ou a busca, ou a intenção foi detalhar ao máximo para que o instituto do litisconsórcio não fosse acanhado, não perdesse a sua aplicabilidade em função de interpretações restritas. Me parece isso, não sei se me fiz claro?
- Você acha esse detalhamento desnecessário?
- Bom, existe um velho brocardo latino que diz: o que abunda não prejudica. Mas me parece, diante da tradição arbitrária que temos no Brasil, alguns detalhamentos ainda são necessários. Mas não no sentido de ampliarmos apenas a questão gramatical, é pela própria tradição autoritária que nós temos no Brasil, pela própria tradição de violência que nós temos no Brasil. O Brasil ainda não sabe conviver com o aspecto democrático. Uma coisa que está passando aí absolutamente clandestina é a Revolta da Vacina. Essa semana fizemos um século da Revolta da Vacina. O Rio de Janeiro há um século atrás estava em verdadeira guerra: dezenas e dezenas de pessoas pela campanha do Oswaldo Cruz à vacinação. Quer dizer, todas as políticas brasileiras autoritárias, e o Judiciário não é diferente. O Judiciário não é exceção a esse sistema. De modo que, infelizmente, diante de uma classe de magistrados normalmente autoritários não pode mesmo ser diferente. A etmologia das palavras nos ajudam muito a compreender essa estrutura. Nós falamos que o juiz é “investido” de jurisdição. Ora, apenas os reis e os papas são investidos. Observem que os termos que são empregados pelo Poder Judiciário, pela estrutura da norma jurídica são termos que se apresentam vinculados a toda uma tradição autoritária: o papa é investido, o rei é investido, o imperador é investido. O que se utiliza na estrutura da linguagem do poder judiciário? A investidura do magistrado, o órgão jurisdicional deve estar investido.
- Porque é continuação.
- Porque é claro: é continuação.
- Tem que se criar uma vacina para a juizíte...
- Mas, entenda, é algo que perpassa o elo jurídico. Você observa que, ao contrário de outros segmentos, até mesmo do próprio Estado, o Poder Judiciário não foi projetado para debater idéias. O sujeito passa lá trinta anos, cercado por um grupo de funcionários normalmente subservientes, cercado conseqüentemente por pessoas que o tratam de excelência; ele tem ao mesmo tempo uma posição autocrática, porque ele não debate, ele apenas decide; ou seja, ele não permite que se tenha um legítimo acesso à Justiça - porque você falar com o magistrado não significa acesso à Justiça. Até essa própria expressão - acesso à Justiça - é errôneo, porque você tem acesso a um funcionário graduado do Poder Judiciário. Daí a falarmos em acesso à Justiça vai uma larga diferença, até porque o conceito de Justiça pertence à Filosofia. Então você percebe que o próprio desenho do Poder Judiciário é um desenho autocrático, a estrutura é uma estrutura autocrática. E mesmo quando se fala aqui, por exemplo, em ampliação do Tribunal do Júri (sim, porque é claro, nós raciocinamos a partir do nosso umbigo, os juristas brasileiros raciocinam a partir do umbigo. Em vários outros países nós temos o júri para uma gama imensa de assuntos. E você pode perceber que, depois tanto autoritarismo, refletir novas idéias é, pelo menos, necessário. Refletir a possibilidade de ampliação, por exemplo, do júri como elemento legitimador de decisões. Fala-se na reforma do poder judiciário, mas essa reforma não vai conseguir alterar essa estrutura e nem se quer alterar essa estrutura, porque o poder judiciário autocrático é um valete, ele serve para os momentos em que eu preciso ter uma válvula de escape autoritária. Então, isso não vai mudar, a não ser que haja um grande embate político, de reforma efetivamente numa estutura do Poder Judiciário. Mas, no Brasil, sem chance.
- Mas o sr. dizia que no inciso IV ficava de fora a conexão de que no objeto?
- Em função do pedido, do objeto, porque o inciso IV ele vai açambarcar apenas a causa de pedir.
O parágrafo único do art. 46 encerra uma questão:
“O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para a resposta, que recomeça da intimação da decisão.”
“O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo” - claro, apenas o facultativo porque o necessário não é possível a sua restrição em função ou da própria obrigatoriedade da norma jurídica, como vimos, ou em função da natureza jurídica que é incindível: eu não posso repartir, eu não posso dividir, eu não posso seccionar aquela relação jurídica, eu só posso pensar aquela relação jurídica na sua integralidade. E aí o art. 46 nos diz que “o juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para a resposta, que recomeça da intimação da decisão.” Ora, nós vamos observar que andou bem o Código quando permitiu essa limitação. Porque realmente em determinados momentos um número excessivo de litisconsortes pode prejudiciar o próprio processo. Então essa limitação foi um acréscimo importante na reforma de 1994.
Andou bem ainda o acréscimo quando não fixou um número porque isso depende do caso concreto. Em determinadas demandas, dez litisconsortes pode ser um número pequeno; cem litisconsortes pode ser um número pequeno. Em outras demandas, oito litisconsortes, cinco litisconsortes pode ser um número muito grande. Por que? Porque tudo depende da complexidade do caso concreto. Assim, não ter fixado na lei um número foi um passo positivo.
Porém, esse acréscimo trouxe alguns problemas, nós abrimos aqui algumas dúvidas, que até já comentamos. Primeiro: quem deve ser excluído? Ou seja, a relação ao critério de exclusão: eu vou excluir os últimos da petição, eu vou excluir por ordem alfabética; eu vou excluir o primeiro, incluir o segundo, excluir o terceiro, ou seja, vou fazer alternado; eu vou excluir os mais novos, ou excluir os mais velhos? Ou seja, a lei não traz nenhum critério de exclusão.
Além de trazer nenhum critério de exclusão, a lei também não traz nenhum critério para definição do destino dos excluídos, a lei não diz se vamos remetê-los à livre distribuição, se nós vamos remetê-los à distribuição, porém, vinculada a uma distribuição em que esses litigantes voltem para um processo em apenso, um processo conexo; ou se nós, simplesmente, vamos excluí-los e ponto final. Agora, se formos excluí-los, nós vamos observar que estamos excluindo sem nenhuma base no art. 267 ou no art. 269. Não há aí nestes dois artigos razão que escore, que justifique alguém ser extirpado de um processo. Conseqüentemente, essas questões levam a uma dúvida em relação à natureza jurídica dessa decisão, o que nos leva a uma dúvida em relação a qual o recurso cabível. Ou seja, qualquer coisa que vocês forem ler em torno deste assunto é mera opinião. Isso é o que mais irrita na doutrina brasileira, isso é o mais dramático: é que determinados autores apresentam soluções a essas questões como se fossem soluções com algum critério legal, como se fossem soluções pautadas em alguma questão sistemática, quando na verdade, isso é um vazio no qual não tem nenhuma escora legal, são meras opiniões dos autores.
Vários nos dizem que na verdade como há um segmento, como na verdade prossegue-se na demanda - e a noção deles sobre sentença é uma noção temporal, logo se a decisão de exclusão foi proferida aqui, e eu percebo uma continuidade da demanda, essa determinada decisão seria uma decisão interlocutória. Sendo decisão interlocutória ela seria agravável, isto é, mesmo a parte tendo sido extirpada do processo, tendo sido posta para fora do processo, não deveria ela apelar, deveria ela sim agravar. Essa é uma posição que costuma ser, em relação ao recurso, mais utilizada. Entretanto, tem alguns doutrinadores que ainda colocam o aspecto ligado à apelação, mas é um número muito reduzido. A maior parte dos autores defende que nessa situação caberia um agravo.
- Acho que apelação aí não cabe, porque não julgou o mérito.
- Sim, mas você tem uma série de momentos processuais que você não julga mérito e você tem apelação. Como eu falei na Introdução: eu tenho processos em que eu tenho três sentenças, a própria sentença falimentar eu não julgo o mérito; a própria sentença na ação de prestação de contas, eu não julgo o mérito porque as contas elas só vão ser julgadas na segunda sentença; a primeira sentença é apenas para dizer se serão ou não prestadas as contas. Quando eu tenho um processo de execução - o art. 713, o concurso de credores - a sentença não põe termo a nenhum processo, ela simplesmente define quem tem a preferência para aquele respectivo resultado de hasta pública. Mesmo a hipótese de julgar mérito não é critério, porque se nós fóssemos vincular a noção de sentença a julgamento de mérito, como nós explicaríamos a sentença no processo cautelar, como é que nós julgaríamos a sentença no processo cautelar? Vamos lembrar que a sentença no processo cautelar não forma coisa julgada material. Eles tentam passar a imagem de que o processo civil seria algo monolítico, sem falhas, sem vícios, sem lacunas. Se você quiser uma imagem do processo civil eu lhe digo: olhe para um queijo suíço - daqueles bem furados. Por que? Porque vocês tem vários e vários pontos de incerteza que são resolvidos por intermédio de uma forma autoritária de transmitir uma concepção processual. O processo, na verdade, não é monolítico, ele não apresenta essa homogeneidade técnica jurídica que eles querem fazer passar. Você reflete um pouco mais profundamente, você percebe toda essa gama de incongruências e paradoxos no processo.
O art. 47 também padece de alguns problemas, eis que a doutrina costuma gritar contra esse artigo de tão mal redigido que ele é. Porque esse artigo na verdade confunde conceitos. E por que afirmo isso? Na terça-feira passada detalhamos bem o litisconsórcio necessário, facultativo, unitário e o simples. Mostramos que é possível a configuração de um litisconsórcio que é necessário ser também unitário, um litisconsórcio facultativo ser também simples; e o inverso, a relação diagonal, um litisconsórcio necessário ser simples, um litisconsórcio facultativo ser unitário. Ou seja, nós mostramos, então, as diferenças desses conceitos.
O art. 47 trata como sinônimos o litisconsórcio necessário e o litisconsórcio unitário. Daí porque tantos doutrinadores desaprovam a redação deste artigo.
Nos diz o art. 47:
“Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.”
“...decidir a lide de modo uniforme”: ora decidir a lide de modo uniforme significa a critério de tratamento, porque ele não pode decidir de modo diferente. Ao passo que no litisconsórcio simples ele pode decidir de modo diferente. Então, forma de decisão não significa necessidade do litisconsórcio, até porque vimos que um litisconsórcio na usucapião é necessário, porém, é um litisconsórcio simples. Mas aqui há uma dicção tal que transforma em sinônimos esses conceitos, como se o litisconsórcio necessário fosse aquele em que a decisão tivesse que ser uniforme para todas as partes.
“...;caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.” Ora, a eficácia da citação de todos é na verdade uma característica do litisconsórcio necessário, porque se a imposição da lei ou a natureza jurídica forçam essa reunião de litigantes, sem que eu tenha todos esses litigantes reunidos eu vou padecer na eficácia da decisão. A decisão, diz aqui o Código, sobre eficácia, a decisão será formalmente válida, porém não produzirá efeitos. O problema aqui é de eficácia.
“Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo.”
Ou seja, na verdade eu tenho aqui uma questão ligada a pressuposto processual para o desenvolvimento válido do processo. O art. 267 nos coloca que o magistrado vai encerrar o processo, ele vai pôr termo ao processo quando detectar a ausência de algum pressuposto processual. É o que nos diz o inciso IV do art. 267. Conseqüentemente, aqui, se eu não tenho todos que são necessários, devidamente citados, eu não tenho pressuposto processual para esse desenvolvimento válido. Razão pela qual o paragrafo único nos diz para por termo a esse processo.
E o art. 48 nos diz que:
“Salvo disposição em contrário, os litisconsortes serão considerados em sua relações com a parte adversa, como litigantes distintos; os atos e as omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os outros.“
Isso não é exatamente assim. Sabemos que, em contrapartida, quando lidamos com a noção de prova, o magistrado tem o livre convencimento. Então, é claro que essa norma não está isolada. Eu tenho que observar que a confissão de um, diante do livre convencimento para análise da prova, pode ter conseqüências, e muito provavelmente terá conseqüências de interpretação das respectivas provas. Assim, obviamente, essa independência não é tão grande.
E ao mesmo tempo, nós temos que verificar que o próprio artigo 509, do CPC,nos diz que:
“O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses”.
Ora, esta idéia do art. 509 está disposta também no art. 580 do Código de Processo Penal. Por que? Porque no concurso de agentes, o recurso interposto por um dos réus, se comum o argumento, aproveita a todos. Então eu posso ter a absolvição, mesmo com base em recurso manejado por outrem. Eu tenho lá quatro réus, apenas um ingressa com recurso em sentido estrito, ou ingressa com uma apelação; mas se o argumento é um argumento comum a todos, todos os réus são absolvidos com base naquele recurso. Ou seja, isso é um padrão processual que se repete. Isso vai servir no processo penal (art. 580); isso vai servir na área de recurso. Se o argumento for comum, como por exemplo, a nulidade de uma determinada obrigação, esse é um argumento comum, sendo assim, engloba a todos, mesmo àqueles que não recorreram. Temos isso também no campo dos embargos: vamos para o processo de execução: neste processo eu aqui proposta a exceução, penhorado o bem, vem os embargos e são vários os executados, mas apenas um ou alguns válidos. Nesse embargo aqui foi argüída a nulidade da obrigação - a falsidade do título. Ora, são questões que aproveitam a todos, e não apenas questões que aproveitem àquele determinado agente que está argüindo.
- Todas as vezes que se fizer necessário eu posso utilizar o CPP, ou eu tenho que transformar alguma coisa aí para poder citar o artigo do outro Código.
- Vamos especificar isso. Eu tenho uma série de idéias que, como disse, são padrões que se repetem. E esses padrões se repetem não apenas na norma processual civil. Por exemplo, eu tenho apelação no civil, eu tenho apelação no penal e eu tenho, no processo do trabalho, o recurso ordinário. Mas eu posso traçar um paralelo, fazer uma análise desses institutos. Vamos observar que eu tenho o agravo no processo civil; mas eu tenho o recurso, no sentido estrito, no processo penal que, em várias das hipóteses de cabimento ele está fazendo o quê? As vezes de um agravo. Eu tenho, por exemplo, a rescisória, no civil; e eu tenho a revisão criminal, aonde eu posso estabelecer um paralelo entre rescisória e revisão criminal. Eu tenho no civil o incidente de uniformização de jurisprudência; na área penal, eu tenho o recurso de revista, que visa a obtenção dos mesmos efeitos da uniformização de jurisprudência. Então, nós vamos observar, apenas para rapidamente aqui um comparativo sem maiores profundidades, temos vários institutos que, na verdade, são institutos que podem ter outros nomes, ou que podem ter outros prazos, outros modos burocráticos de manejo, mas a idéia que funda estes recursos, ou estes institutos processuais é a mesma. No próprio processo civil temos a apelação e temos o recurso ordinário que serve para quando eu tenha decisões nos Tribunais que sejam originárias. Se elas são originárias como é que eu vou exercer um segundo grau de jurisdição? Através de um recurso, nós chamamos este recurso de recurso ordinário, mas ele é em tudo semelhante à apelação, por que? Porque o fundamento é o mesmo, a idéia é a mesma. Grave esta frase: o processo é um estudo da repetição de padrões. Eu tenho um conjunto pequeno de padrões e eu repito este conjunto, não só no processo civil, mas eu repito esse conjunto de padrões em toda a sistemática. Está claro?
E o último dispositivo, art. 49, assim dispõe:
“Cada litisconsorte tem o direito de promover o andamento do processo e todos devem ser intimados dos respectivos atos.”
Ora, isso nos faz pensar na duplicidade de prazos, por que? Porque o art. 191, nos coloca que eu tenho o prazo em dobro quando da estrutura de litisconsórcio. Vamos observar que esse prazo em dobro, obviamente, foi agregado de um apêndice jurisprudencial. Porque o art. 191 nos diz:
“Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos”.
Essa estrutura de prazo em dobro quando há procuradores distintos, foi acrescentada jurisprudencialmente a noção de que não basta procurador distinto: é necessário que esse procurador pertença, efetivamente, a um outro grupo de advogados, porque, do contrário, eu, num mesmo escritório, bastaria fornecer procurações individualizadas a cada qual dos membros desse litisconsórcio para ganhar a hipótese de prazo novo. Na verdade, esse não é o objetivo: o objetivo aqui é propiciar que, aqueles que efetivamente tenham advogados distintos tenham também um prazo adequado para consulta dos autos. De modo que jurisprudencialmente se agregou aqui essa questão ao art. 49. Feito isso, vamos ter um intervalo e, na volta, vamos para a assistência .


SEGUNDA PARTE:
Antes de entrarmos na assistência, um pequeno parentese. Nós tivemos agora na quinta-feira passada a provação da reforma do Judiciário no Senado. Esse debate sobre a reforma do Judiciário além de ser extremamente autocrática, porque essa reforma, na verdade, não está sendo debatida, está sendo apenas justificada por determinados setores. Debate é algo muito diferente. O que está acontecendo é basicamente isso, numa rápida figura de linguagem nós conseguimos explicar o que está acontecendo. Quando há um determinado hospital eu não posso fechar a porta deste hospital, eu não posso impedir que as pessoas entrem. O setor de educação e de saúde neste país as pessoas morrem em cima das macas nos corredores e mesmo assim eu não posso fazer o que? Eu não posso fechar a porta, o que eu posso fazer é uma triagem de quem vai morrer e de quem vai sobreviver, ou, se não sobreviver, receber pelo menos atendimento. É assim que funcionam os hospitais públicos, a saúde pública no Brasil. Aliás é assim que funciona tudo que é público no Brasil. Mas a porta tem que ficar aberta.
No Judiciário, como nos hospitais, as pessoas também morrem nos seus direitos, “em cima das macas”. Só que o que está sendo feito é o fechamento da porta deste “hospital”. Ou seja, ao invés de nós identificarmos os verdadeiros problemas do Judiciário que é a falta de juízes, a falta de estrutura, a brutal incompetência na administração, o corporativismo; além do corporativismo um apadrinhamento desmedido; a falta de formação dos magistrados. Ou seja, ao invés de efetivamente atacarmos todos os problemas de fundo do Poder Judiciário e para isso bastar pensarmos o quê? O Tribunal de São Paulo, por exemplo, que é efetivamente o mais lento do país, começou o seu processo de informatização em 2003. Mas de acordo com a revista Exame, por exemplo, no orçamento de 2002, consta uma verba de três milhões de reais para a troca de carros dos magistrados. Então, vamos observar que isso é uma opção da cúpula do Tribunal. O Tribunal é controlado pelo seu órgão especial, e esse órgão especial é que determina as prioridades. E no rol das prioridades do Tribunal paulista é mais importante dar carros novos aos magistrados, do que informatizar o Tribunal para se prestar um serviço mais rápido.
Então você observa que ao invés de você atacar efetivamente os problemas reais do tribunal, você cria, através da USP, a escola Paulista de Processo, que domina desde os tempos de Liebman a noção processual; Alfredo Buzaid, era da USP, assim como Cândido Dinamarco, Ada Pellegrini; e seus assistentes que podem não ser necessariamente da USP , que circundam a Escola Paulista, como Nelson Néry Jr; juristas como Luiz Guilherme Marinoni; enfim, todo esse grupo de São Paulo criou a idéia de um espantalho. E qual é esse espantalho? Celeridade. Ou seja, ao invés de atacar a lentidão na prestação de serviço do Judiciário, você cria, através de um discurso, a idéia da celeridade. E aí você justifica, com a idéia da celeridade, toda e qualquer atrocidade contra os direitos processuais, garantias processuais. E você começa a falar, então, em súmula vinculante, em súmula impeditiva de recurso, em redução de recursos, em depósitos recursais, em argüição de relevância - só pode chegar ao Supremo o que for relevante para o país. Ora, o que é relevante para o país? É relevante para o país aquilo que o Estado achar que é. Ou seja, você cria, através dessa palavra, que não é exatamente bem definida, é uma palavra vaga, uma palavra imprecisa, uma carta branca para você solapar toda e qualquer garantia. E no pacote de dez reformas que foi enviado na semana passada, consta uma alteração no Código de Processo para punir os advogados por recursos protelatórios. Assim, o que nós estamos vendo é que em nome dessa tal celeridade o que estamos vendo é um verdadeiro massacre das garantias processuais.
- A OAB calada.
- Mas é claro, ela indica o quinto constitucional. Esta foi uma forma de comprá-la. Foi muito barato comprar a OAB e é muito barato você comprar o Ministério Público. Claro, as fogueiras das vaidades - assista “Advogado do Diabo”. A vaidade humana: ah! eu pertenço à cúpula! Eu posso ser indicado para desembargador, por que, então, eu vou ser contra? Por que eu vou criticar? O Ministério Público - o guardião - por que ele vai criticar? Ele pode ser desembargador, melhor ficar calado, melhor puxar o saco, eu chego lá puxando o saco.
Então nós vamos observar que ao invés de trabalharmos os problemas estruturais, eu crio através de discursos uma figura que é bonita. Ora, quem é que não quer celeridade? Fica difícil falar contra a celeridade. Você é o chato que está falando contra a celeridade. Ora, a celeridade é uma maravilha! Você entra com o processo e ele é decido rápido, quem é que não quer isso? Como é que o sujeito é louco de falar contra a celeridade? Mas o problema é como é que esse discurso está sendo estruturado e de onde ele tira a atenção. Ele tira a atenção dos problemas de fundo da estrutura judiciária. E aí você começa a criar expressões cada vez mais abertas, em nome dessa celeridade, como o tal curso protelatório. Se a lei lhe deu o curso, se a lei dispõe a você a possibilidade de recorrer a lei não lhe dá nada que seja protelatório. A lei lhe dá o direito de defesa, porque o que nós podemos é dizer que o recurso foi bem fundamentado ou mal fundamentado. Mas daí a dizer que é protelatório é um critério absolutamente subjetivo.
E nós vamos observar que além dessa subjetividade, nós já temos instrumentos. Nós já temos os instrumentos por que? Porque a OAB ela tem um Tribunal de Ética e este é o foro adequado para se discutir se a postura de um advogado, foi contrária à Ética ou não. Mas é um foro separado, é um foro que não está no bojo do processo. E no Tribunal de Ética haverá o devido processo legal para impor qualquer sanção. Ao passo que uma sanção ética disposta no curso do processo ela é desprovida do devido processo legal. Por que? Porque o objetivo do processo é debater o lucro cessante de um determinado caso e aí, como um plus, você impõe uma pena a esse advogado, sem o devido processo legal, sem que se fosse criado um foro apropriado para ele se defender. Porque uma pena protelatória não tem um foro apropriado. Quando você tem um recurso considerado protelatório você não teve um espaço para se defender daquela idéia. É algo absolutamente autoritário, autocrático.
Mas isso não basta para eles. Esse desejo, essa gana de celeridade que, na verdade, é autoritarismo, agora vai envolver num desses dez projetos que foram criados, a penalidade ao próprio advogado. Que eles tentaram mas não conseguiram inserir na reforma do art. 14. Agora vão conseguir inserir. Percebam - é claro, nós não vamos mudar o mundo - mas, pelo menos exercer um juízo crítico num momento de pós-graduação é fundamental. Pelo menos exercer um juízo crítico nessa correria do dia-a-dia é fundamental para se perceber que os verdadeiros motivos, os motivos de fundo, os motivos de base, os motivos que estão no alicerce dessa estrutura não são atacados. Muito pelo contrário: esse discurso da celeridade ele é todo uma cortina de fumaça. Os dados estatísticos mostram que enquanto a média de distribuição de uma apelação em São Paulo é de quatro anos; no Rio de Janeiro, por exemplo, nós temos aí alguns dias. Normalmente, em vinte e quatro horas o processo já está autuado na mão do desembargador. Se formos pegar os dados estatísticos podemos ter ainda alguns dias.
- Em São Paulo leva quatro anos?!
- Quatro anos! Você faz o protocolo no Tribunal, chega lá no protocolo dá entrada na sua apelação, você vai saber quem é o desembargador que será o relator, daqui há quatro anos. Por isso que você tem uma centena de centenas de empresas paulistas que nos seus contratos estão colocando na sua cláusula de eleição de foro como juízo competente o Rio de Janeiro. As duas empresas estão em São Paulo, o contrato foi celebrado em São Paulo, vai ser cumprido em São Paulo, mas as partes estão colocando na sua cláusula de eleição de foro o Rio de Janeiro como juízo competente para dirimir toda e qualquer dúvida. Por que? Porque a média do Tribunal paulista os dados estatísticos mostram que o processo para chegar da petição inicial à sentença, mais a apelação está em dez, onze anos.
- Por que esta discrepância?
- Administração do Tribunal. Então você vai observar que o problema fundamental é como é que essa máquina está sendo gerida. E aí, eu que sempre sou ácido nas críticas, vou fazer aqui um elogio: o Tribunal do Rio de Janeiro, comparativamente, é o melhor do país. Comparativamente, levando em consideração o número de causas versus o número de juízes, para eu chegar no dado estatístico, o Tribunal do Rio de Janeiro é o mais célere. Porque, é claro, eu tenho julgamentos que se dão em menos tempo, mas em Estados como o Acre, como Roraima; aí é fácil você ser rápido. Agora, num Estado como o Rio de Janeiro, ou num Estado como São Paulo é que eu tenho que medir a eficiência comparativamente.
Vamos observar, portanto, que esse espantalho da celeridade está encobrindo a incompetência dos desembargadores paulistas. O número de julgados dos desembargadores paulistas gira em torno de 850 a 890 causas/ano. Em São Paulo, na própria Justiça Federal, isso chega a 1900, 1800; ou seja, os juízes federais de segunda instância, que se auto-intitulam desembargadores (porque a Constituição diz que eles são juízes, esse cargo, desembargador federal, é estranho ao rito constitucional); mas os “desembargadores” federais de São Paulo julgam quase mil processos a mais, por ano, do que os desembargadores de São Paulo. Por que? Por que duas férias por ano? Por que recesso? O Tribunal do Rio de Janeiro não tem recesso, mas o Tribunal de São Paulo fecha duas vezes por ano. E isso independente das férias, porque eu posso descasar as minhas férias do recesso, por que? Porque eu não posso confundir o período de recesso com o período de férias: depois do recesso, aí, sim, eu gozo as minhas férias. Por que?
Então, ao invés de eu atacar esses problemas, é muito mais fácil falar em “celeridade”. Por que? Porque aqui eu estou no campo das palavras, lá eu estou no campo dos interesses políticos. Aqui eu preciso de VERBA; lá eu preciso de...
- Verbo.
- Sim, bem pensado, aqui é verbo. Eu crio esse discurso e com esse discurso eu mantenho essa série de coisas.
E que vimos na semana passada? O Senado aprovando. A única coisa boa que existia foi desfigurada pelo Senado, que era o controle externo (o Senado retirou a possibilidade desse controle externo aplicar sanções). De modo que estamos, efetivamente, indo de mal a pior.
O art. 50 ele começa a discriminar a assitência. E a assistência é o meio pelo qual nós vamos permitir que alguém que é estranho as polaridades do processo vá a juízo e contribua - ou, como o próprio nome diz, dê assistência a uma dessas polaridades. Vamos observar que o CPC regula o litisconsórcio e no mesmo capítulo ( porque o referido capítulo é o V - Do Litisconsórcio e da Assistência - dividido em duas secções ), trata de modo conjunto o litisconsórcio e a assistência. A doutrina tradicional costuma trabalhar a assistência, não junto com o listiconsórcio, mas diz que a assistência é um modo de intervenção. Daí porque na doutrina nós vamos observar a assistência junto com os estudos da intervenção de terceiros. Me parece que essas duas posições padecem de problemas, por que? Porque no litisconsórcio nós estamos sempre falando de partes. Nas intervenções de terceiros nós estamos sempre falando de partes e mais de terceiros que querem intervir ou que serão compulsoriamente carreados ao processo e que num determinado momento vão adquirir a qualidade de parte.
Na assistência isso não acontece. Na assistência ele ingressa como assitente e permanece como assistente durante todo o processo. Nessa medida, isso é um traço fundamentalmente diferenciador tanto do litisconsórcio quanto das intervenções de terceiros. Vamos pensar que, por exemplo, na denunciação da lide, ele adquire a qualidade de parte; na nomeação à autoria, ele adquire a qualidade de parte; no chamamento ao processo, ele adquire a qualidade de parte; na oposição, ele adquire a qualidade de parte. Então, o adquirir a qualidade de parte é o desaguar de um processo interventivo. Na verdade, a intervenção de terceiros ela pode ser concebida como o que? A dinâmica de um processo, num determinado momento eu posso, não paralisar, mas num determinado momento eu abro uma frente de debates a respeito da possibilidade ou não de uma intervenção. Se a resposta for não, aquele sujeito vai embora; se a resposta for sim, aquele sujeito se torna parte. E aí eu volto à respectiva discussão para o mérito. Então, esse traço caracterizador das intervenções de terceiros não acontece na assistência, porque o assistente não adquire essa qualidade e ele não é atingido pela coisa julgada.
E aí nós vamos observar as duas modalidades de assistência que se apresentam no nosso sistema processual.
Quando falamos em assistência nós falamos em assistência:
simples;
e qualificada (ou litisconsorcial).
Vamos observar a assitência simples.
“Art. 50. Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no processo para assistí-la.”
Eu preciso, então, deste interesse jurídico. Interesse jurídico que não se confunde com interesse meramente econômico, ou meramente moral. Eu preciso ter um interesse jurídico e precisamos identificar isso à luz do direito material. Nós teremos uma assistência simples toda vez que o direito material compuser esse tipo de estrutura:









Eu tenho uma relação jurídica entre A e B; e tenho uma segunda relação jurídica entre B e C. Mas eu não tenho relação jurídica entre A e C. Sempre que a configuração no direito material for esta, nós teremos no âmbito do direito processual uma assistência simples.
A aluga para B, que subloca para C: assistência simples. Por que? Porque eu tenho uma relação entre A e B, que é a relação locatícia; e eu tenho uma outra relação de B para com C, que é a relação de sublocação. Mas eu não tenho um vínculo jurídico - e eu não posso confundir o vínculo jurídico com aspectos econômicos dessa situação jurídica, eu não tenho um vínculo jurídico entre A e C. Não há um vínculo direto, não se estabeleceu uma relação jurídica. C terá que suportar economicamente uma sentença desfavorável a B, mas esse é o aspecto econômico de um sentença. Eu não posso confundir esse aspecto econômico. A questão fundamental é que C interdepende, em função de uma relação jurídica, de B. Daí porque há um interesse jurídico de C em que B saia vitorioso dessa respectiva demanda.
O que determina se a minha assistência será simples ou qualificada, vale dizer, litisconsorcial, é o direito material. Porque na assistência litisconsorcial a minha configuração do direito material será extinta. Vamos observar na assistência qualificada a minha relação de direito material será essa,








porque a questão debatida entre A e B também é de titularidade de C. C também é titular do direito que está sendo debatido. Ele não tem uma relação transversa com A, o vínculo dele não é apenas com B, ele tem uma relação direta. Imaginemos aqui, qualquer questão que envolva condomínio, entre direitos de A e de B; e que, porventura, tenhamos apenas B numa polaridade do processo. Então, nessa medida, como o direito que está sendo aqui debatido também é um direito de titularidade de C, C não adquire a qualidade de parte quando bem entender. Você não chega no processo e diz assim: ei, eu quero ser réu aí, ou, eu quero ser autor. Não, uma vez estabelecido o processo se estabilizam as suas polaridades. Se A propôs a ação apenas em face de B, mas o direito aqui debatido também era de titularidade de C, C é réu? Não, C não é réu, porque a ação não foi proposta em face dele.
Como é que eu adquiro a qualidade de réu? Apenas quando alguém ingressa com uma ação e me aponta como réu. Ora, se C , apesar de ser titular do direito, não foi apontado por A - este só apontou B para aquirir a qualidade de réu, então, C não será réu. Mas poderá, então, ingressar nesse processo, auxiliando, assistindo, contribuindo com B, porque lhe interesse direto a vitória de B.
E é claro que isso pode acontecer aqui também, a assistência pode se dar de ambos os lados. Nós estamos aqui apenas exemplificando como réu, mas podemos tê-lo como autor.
- Esse exemplo que você está dando é muito parecido com litisconsórcio necessário. Queria que você me desse um exemplo para poder melhor identificar isso aí.
- Se você tem um bem em condomínio, imaginemos que foi proposta uma ação apenas em face daquele que detém esse determinado bem em condomínio com você.








Ora, essa sentença está deliberando sobre um bem que da sua titularidade. Então, conseqüentemente, você percebe que há a sua união aqui, em função do condomínio, mas há também, dado que o bem é do condomínio, um interesse, uma relação que se estabelece entre aquele que propôs a demanda e você que foi não incluído nessa respectiva demanda. Vamos observar que eu não tenho, por vezes, como vislumbrar um caso desses como litisconsórcio necessário. Porque, por exemplo, o fato de você ter um bem ou um direito em condomínio com o seu irmão ou a sua irmã, não significa que ela não possa celebrar um determinado negócio e ofertar, dentro do seu direito disponível aquele determinado quinhão condominial.
- Bom, mas nesse caso que você está citando o bem em condomínio ele já faz parte do quinhão; assim, não há interesse na assistência. Qual seria o interesse já que ele está dispondo de um patrimônio que é só dele?
- Quando você trabalha o aspecto pertinente à disposição patrimonial, o direito que você tem aqui, que é o direito à propriedade, que é também e, conseqüentemente, indivisível, porque a perda da propriedade aqui (1) vai incidir também na perda da propriedade aqui (2).








O prejuízo que ele vai ter sob os aspectos não só econômicos, mas sob os aspectos também jurídicos, porque é o próprio bem dele que está sendo versado nessa sentença, então ele tem, efetivamente, apesar de uma separação, digamos assim, abstrata da relação de condomínio, apesar de uma separação ideal, hipotética na relação de condomínio, ele tem as conseqüências jurídicas e econômicas dessa relação aqui. E, conseqüentemente, ele pode querer defender o seu patrimônio. Mas como ele vai defender o seu patrimônio, que é patrimônio dele, se ele não foi apontado como réu?
- Agora consegui vislumbrar.
- Como ele não foi apontado como réu, ele não poderia argüir nada, porque ele não foi apontado como réu, ele não adquiriu essa qualidade. Mas para proteger o patrimônio dele, pessoal, ele tem que ingressar nesse processo. E ele ingressa como? Ele vai ingressar como esse sujeito aqui? Claro que não. Ele vai ingressar, porque o patrimônio é dele, como um assistente qualificado. Daí porque vai se chamar de assistente litisconsorcial. O que significa que um assistente simples, por exemplo: se A e B resolvem fazer um acordo, C não é consultado; na assistência litisconsorcial, se A e B resolvem fazer um acordo, C também tem que concordar, pois do contrário não se faz o acordo. Se eu tenho na assistência simples, prazo simples, aqui eu tenho a regra do art. 191 incidindo, prazo dobrado. Aqui, o assistente simples ele vai apenas completar os atos praticados pela parte. Aqui ele é autônomo. Nós vamos observar, então, que se há um pedido de desistência de A, B precisa concordar na assistência simples, C não é consultado. Na assistência qualificada C precisa concordar com essa desistência, porque ele está sendo tratado como litisconsorte. Daí porque a assistência qualificada é chamada de assistência litisconsorcial. E tudo por que? Por que ele está sendo tratado como litisconsorte? Porque o direito que está sendo debatido aqui é dele.
O Arruda Alvim, se não me falha a memória, diz que a assistência litisconsorcial é a assistência para aquele que deveria ou poderia ter sido parte e não foi.
Vamos observar o texto do art. 54, que vai nos dar uma visão melhor a respeito disso. O art. 54 precisa ser compreendido com muita calma, porque num ranking dos mais mal redigidos ele ficaria ali entre os dez mais. E o que nos diz o art. 54?
“Considera-se litisconsorte da parte principal o assistente, toda vez que a sentença houver de influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido.”
O art. 54 é o que nos dispõe sobre a assistência qualificada.
“Considera-se litisconsorte...” Ora, eu considero apenas aquele que não é. Aquele que é, é. É uma questão de lógica. Aquele que é, é. Eu só considero aquele que não é. Ex.: o meu irmão de consideração. Por que? Porque não é o meu irmão. Se for meu irmão não é de consideração: é meu irmão. Então, isso significa, ao mesmo tempo, que ele não é parte. E isso significa, então, que eu tenho um tratamento, isso é uma relação de tratamento: ele não é parte, mas ele será considerado, para efeitos processuais como litisconsorte, o que significa afirmamos, então, que ele estará recebendo e gozando de todas as questões processuais que envolvem um litisconsorte. Agora, é fundamental frizarmos isso: que ele não é parte. Por que é fundamental frizarmos isso? Quando você sai daqui e vai lá para a parte ligada à coisa julgada, a coisa julgada é dada entre quem? Entre as partes. Ora, a coisa julgada é dada entre as partes - e aqui ele não é parte.
“Considera-se litisconsorte da parte principal...” Risquem “principal”, porque eu não tenho parte secundária. “Parte” é um conceito que não comporta níveis. Uma mulher pode estar meio grávida?
- Depende.
- Meio grávida?
- Depende da lógica do ponto de vista, ela pode crer que está.
- Aí já é... É um conceito que não comporta meio termo: ou está ou não está grávida.
Então, se eu não tenho parte secundária, esse “parte principal” é um contrasenso. Eu tenho parte e tão-somente parte, porque ele não é parte. Ora, se ele não é parte eu não posso ter parte secundária.
“Considera-se litisconsorte da parte o assistente, toda vez que a sentença houver de influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido.”
Ora, essa sentença ela está dispondo sobre direito do assistente. Toda vez que a sentença tiver de influir na relação jurídica entre ele (quem é “ele”? O assistente) e o adversário do assistido. O adversário do assistido é a parte ex adversa.
Então nós temos aqui: A. B e C como assistente. Assim, se eu digo que eu considero litisconsorte da parte, porque quem é parte é B, o assistente; toda vez que a sentença será prolatada por esse juiz e que vai dispor sobre um direito que também pertence a C houver de influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido. Ou seja, é um artigo bem truncado, mal redigido, dava para se redigir isso de várias outras formas, de modo bem mais claro; se fosse necessário, desmembrando em paragráfos ou alíneas para detalhar isso melhor. Mas em suma, não o fizeram, o que trouxe essa confusão.
Visto, então, os aspectos ligados à assistência - simples e qualificada, vamos buscar analisar os dispositivos restantes.
“Art. 50. Parágrafo único. A assistência tem lugar em qualquer dos tipos de procedimento e em todos os graus da jurisdição; mas o assistente recebe o processo no estado em que se encontra.”
Ora, nós vamos observar então que, diferente das outras modalidades, a assistência pode ser manejada, ela pode ser observada em qualquer tempo e grau. O que difere muito, por exemplo, do aspecto até mesmo gramatical da oposição, porque a oposição é clara e nítida. Diz o Código que eu só posso ter a oposição até a sentença. Depois da sentença não é cabível o manejo de oposição. O mesmo diz em relação à denunciação da lide, em relação ao chamamento ao processo, nomeação à autoria: eu não tenho essa liberdade temporal para os institutos da intervenção. Já a assistência eu tenho a qualquer tempo e grau. E posso pensar inclusive no manejo da assistência no processo de execução, por exemplo. Ao passo que as intervenções não são factíveis no processo de execução. Eu não posso manejar a intervenção, seja ela a denunciação, o chamamento, a nomeação em sede executiva, por que? Porque todas elas se destinam a questões ligadas ao julgamento da causa, e no processo de execução eu não tenho o julgamento da causa, ou seja, eu não tenho o julgamento de mérito.
Não vamos confundir aqui questões ligadas ao mérito. O mérito, no processo de conhecimento, está sub judice, no sentido de que ele é uma dúvida e a sentença vai dirimir essa dúvida, ele está sendo julgado. Ao passo que no processo de execução eu também tenho o mérito. Muito cuidado com alguns autores aí que dizem que no processo de execução não tem mérito. Ora, meus caros, a noção de mérito é uma questão ligada à essencia do processo. Eu não posso pensar em processo sem partes, assim como eu não posso pensar em processo sem mérito. Porque o mérito é a pretensão material que se transforma em pedido, a pretensão material origina um pedido e este pedido vai ser acolhido ou rejeitado. Então o mérito da execução não está sendo julgado, mas ele deve ser implementado, ele deve ser satisfeito. Porque se eu parto de uma posição de “certeza”, que nos é dada pelo título executivo, o mérito da execução é a própria satisfação da obrigação que está espelhada no título. Eu tenho mérito na respectiva execução. Mas como as intervenções servem para o ato de julgar e na execução eu não estou julgando, eu estou satisfazendo a obrigação representada no título, eu não posso manejar as intervenções no processo de execução. Mas a assistência é possível, basta pensarmos, por exemplo, na hipótese de assistência em que eu tenho um locatário e eu tenho um fiador. Uma execução de aluguéis atrasados. O fiador pode ser assistente do locador, porque ele, fiador, tem interesse em que primeiro sejam consumidos os bens do locatário, para que só depois sejam consumidos os seus bens. Então, ele pode auxiliar o locador a encontrar os bens do locatário. Então eu posso ter uma assistência em processo de execução, o que não é facultado às intervenções.
- Isso não seria um contrasenso, porque se o fiador está auxiliando o locatário, está garantindo o locatário?
- Na medida em que o fiador tem interesse jurídico para que os bens do locatário sejam primeiro executados, não há um interesse meramente econômico, mas jurídico, ele tem interesse em que os bens do locatário sejam executados para que só depois se avance para os seus bens, ele tem um interesse, que interesse é esse? O interesse de que o locador tenha maior sucesso nessa execução. E quem fala disso, por exemplo, é até o próprio Marinoni; tem alguns outros que falam disso também, ter o fiador auxiliando o locador nessa execução para que seja possível melhor organizar e implementar os comandos todos.
- O art. 595?
- O art. 595 fala das questões ligadas à responsabilidade patrimonial, quando ele determina que “o fiador quando executado poderá nomear à penhora bens livres e desembargados do devedor. Os bens do fiador ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação do direito do credor.
Parágrafo único. O fiador, que pagar a dívida, poderá executar o afiançado nos autos do mesmo processo.”
Na verdade o art. 595 está tratando do litisconsórcio. Proposta a execução em face de ambos, ele indica. Agora - por isso que eu tenho que imaginar do ponto de vista teórico também - imaginemos que a execução tenha sido proposta, apenas e nesse momento, em face do locatário. É o fiador, que está sendo neste momento executado? Não. É por isso que eu não posso pensar no art. 595, pois ele fala da hipótese de litisconsórcio. Aqui, a execução foi proposta apenas em face do locatário. Ele, fiador, ingressa como assistente para que ele, locador, tenha êxito em face do locatário. Porque este tendo êxito em face do locatário, ele, fiador, não responderá com seus bens. O art. 595 é litisconsórcio.
Vamos observar, então, as disposições do art. 51.
Se qualquer das partes alegar, no entanto, que falece ao assistente interesse jurídico para intervir a bem do assistido, o juiz:
I - determinará, sem suspensão do processo, o desentranhamento da petição e da impugnação, a fim de serem autuadas em apenso;
II - autorizará a produção de provas;
III - decidirá, dentro de 5 (cinco) dias, o incidente.”

“Não havendo impugnação dentro de 5 (cinco) dias, o pedido do assistente será deferido.” Ora, então, o assistente vai formular o seu pedido. Formulado o seu pedido, o juiz determina as partes que vão poder impugnar ou não impugnar. Se não impugnar o pedido é deferido, o pedido é admitido. Mas se há uma impugnação, nós vamos desentranhar esse pedido. Se qualquer das partes alegar, no entanto, que falece ao assistente interesse jurídico para intervir a bem do assistido, o juiz se ....., determinará, sem suspensão do processo, o desentranhamento da petição e da impugnação a fim de serem autuadas em apenso. Isso é o que determina o inciso I.
O inciso II nos diz - “ autorizará a produção de provas” . Ora, eu tenho que pensar aqui que se o Código não me define quais provas ou não me limita a determinados tipos de prova, eu posso então, em princípio, pensar aqui na produção de qualquer tipo de prova. É claro que do ponto vista prático, nós vamos ter na maior parte das vezes prova documental. Mas isso não significa que do ponto de vista teórico esteja excluindo outras modalidades de prova. Eu posso, na lacuna da lei, pensar em ouvir testemunhas, eu posso pensar em produção de depoimento pessoal, eu posso pensar até mesmo no estabelecimento de algum tipo de inspeção judicial. Enfim, aqui a possibilidade de provas é extensa. E , nessa medida, eu posso produzir provas ou não ter a necessidade de produzir provas.
E aí nos diz o inciso III: “decidirá, dentro de 5 (cinco) dias, o incidente.” E, obviamente, dessa decisão, é possível que eu tenha agravo ou de que não haja recurso, ou seja, que não seja manejado o respectivo agravo.
Deste modo, a dinâmica da intervenção está disposta no art. 51 e segue essa disposição, lembrando sempre o aspecto ligado ao trecho final do parágrafo único do artigo antecedente, porque o assistente recebe o processo no estado em que se encontra, ou seja, eu não vou repetir nenhum ato em função da intervenção desse assistente. De modo, que se eu tenho a dinâmica da petição inicial chegando até a sentença, dependendo, no momento em que ele vai fazer a intervenção, obviamente ele vai ter pouca capacidade de influenciar e eu não vou ter repetição nos respectivos autos.
Vamos procurar compreender o art. 52 pois entre o caput e o parágrafo único tem havido alguma desinteligência.
“O assistente atuará como auxiliar da parte principal, exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido.”
Parágrafo único. Sendo revel o assistido, o assistente será considerado seu gestor de negócios.”
Ora, vários autores nos dizem que o caput se refere à assistência qualificada, ao passo que o parágrafo único se refere à assistência simples. Por que eles dizem isso?
“O assistente atuará como auxiliar da parte principal, exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido.”
Ora, se eu estou me referindo a poderes e ônus, e eu estou dizendo que são os mesmos, só aquele que é litisconsorte pode se valer dos mesmos. Aquele que não é litisconsorte não se valerá “dos mesmos” poderes e ônus processuais.
O parágrafo único, em contrapartida, nos diz:
“Sendo revel o assistido, o assistente será considerado seu gestor de negócios.” Ora, quem é litisconsorte não é apenas gestor de negócios, porque, lembrem-se, que o gestor de negócios, instituto do direito civil, não pode dispor de direitos. Ou seja, ele não pode, por exemplo, fazer um acordo, uma transação, uma conciliação, não pode concordar com a desistência, porque tudo isso implica em disposição de direitos. O direito material disciplina que o gestor de negócios não pode dispor de direitos. Ora, ao mesmo tempo o caput do art. 52 está nos dizendo sobre “os mesmos”. Ora, quando falamos aqui sobre os mesmos ônus e faculdades é algo que é incompatível com a noção de gestor de negócios. Daí porque vários autores se manifestam no sentido de que o caput estaria se referindo à assistência qualificada, ao passo que o parágrafo único se referiria à assistência simples.
- Mas quanto ao caput do art. 52, e se ele for assistente do autor e não do réu, como é que fica? Vai ter o mesmo ônus do que o assistido?
- “O assistente atuará como auxiliar da parte principal,” - já vimos que não há parte secundária, portanto o assistente atuará como auxiliar da parte, exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido.”
- E se ele for assistente há ônus processuais...
- Ônus processuais são suportados tanto pelo autor quanto pelo réu.
- Certo, certo, eu que tinha interpretado mal.
- Eu aplico aqui a ambos os casos.
- O art. 53 nos diz que:
“A assistência não obsta a que a parte principal reconheça a procedência do pedido, desista da ação ou transija sobre direitos controvertidos; casos em que, terminando o processo, cessa a intervenção do assistente.”
Ora, o art. 53, é clara e nitidamente, a disciplina, os limites da assistência simples, aonde ele não é consultado para a transações, conciliações, desistências, aonde ele não tem influência sobre esses destinos do próprio processo no que tange a atos de disposição. Daí porque o art. 53 é disciplina da assistência simples.
- O art. 53 não está conflitando com o parágrafo único do art. 52? Porque se ele pode desistir, ele não pode ser revel, não querer se defender e aí o outro entra com...
- Não, é que a assistência não obsta que a parte promova esses atos. Quem está promovendo o reconhecimento da procedência, a desistência, a transação é a parte. A assistência simples não obsta, ou seja, a assistência simples não impede que a parte faça isso.
Já se é uma assistência qualificada - litisconsorcial - a assistência impede. Porque se eu não tenho a concordância do litisconsorte o processo vai...
- Se for assistência simples, sendo revel...
- Sendo revel o assistente será considerado o seu gestor de negócios.
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- O art. 319 nos dá a revelia, e a revelia é o não contestar. Essa revelia pode ou não produzir efeitos. Se ela produzir efeitos nós vamos ter a ficção que é a revelia reputar como verdadeiros os atos. Se eu não produzo esses efeitos aí o processo segue em direção as provas. Claro, são questões verdadeiramente excludentes: se eu estou considerando verdadeiros eu não preciso de prova. Agora, se eu não considero verdadeiros, aí, sim, eu necessito de provas. São caminhos logicamente excludentes. Se eu tenho, então, A propondo em face de B, B devidamente citado e não apresenta contestação, ele não contesta, eu vou precisar observar o que? Eu vou precisar observar, à luz do art. 319, a produção dos efeitos, ou não dessa revelia. Por que? O próprio art. 320 nos dá as hipóteses em que, mesmo revel, eu não vou reputar verdadeiro os atos alegados. Então, imaginemos, que no transcurso desse processo ele, réu revel, tem alguém que ingressa para assistir e não é impugnado por A, ou se impugnado o juiz decide favoravelmente a essa assistência. Nos vamos verificar que ele vai ser gestor de negócios. Por exemplo, se A (já que B é revel) quiser tansacionar não o poderá fazer com C, porque ele, como gestor de negócios, não pode dispor sobre direito de B. Se A quiser desistir, nós teremos que tentar novamente intimar B a se manifestar da desistência. Mas C não tem nenhuma possibilidade de querer se opor a esse pedido de desistência. E, ao mesmo tempo, C não tem qualquer poder de reconhecer procedência de pedido. O gestor de negócios vai atuar na medida em que se promovam atos de conservação apenas. Ou seja, ele vai peticionar, pedir a produção de provas, enfim, ele vai fazer os atos normais de um curso processual.
Eu peço que vocês dêem uma lidinha para a próxima aula no art. 55, que é por onde vamos começar na aula que vem. E oposição e nomeação à autoria. Na terça-feira que vem, provavelmente, conseguiremos cobrir essas duas temáticas.
Um grande abraço. Até terça-feira que vem.

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