Aulas Transcritas de Processo Civil
terça-feira, março 15, 2005
 
Aula do dia 22/02/2005
DA RECONVENÇÃO - art. 315 e seguintes.

Art. 315. O réu pode reconvir ao autor no mesmo processo, toda vez que a reconvenção seja conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.

Quando se diz que o réu pode reconvir ao autor, eu na verdade estou disciplinando aqui uma das condições da ação, que vem a ser a legitimidade. Ora, quando nós tratamos da temática das condiçoes da ação temos que lembrar que uma delas diz respeito à legitimidade, tanto ativa quanto passiva, razão pela qual quando nos deparamos com o tema da legitimidade no âmbito da reconvenção nós temos que a legitimidade é restrita. Porque como legitimado ativo nós temos o reconvinte, ou seja, só aquele que é réu em uma demanda pode ter legitimidade ativa para reconvir. E a legitimidade passiva o art. 315 nos estabelece que só o autor da demanda primeira, da demanda principal é que pode ser reconvindo.
Isso nos leva a uma indagação: e nos casos de litisconsórcio necessário? Nos casos de litisconsórcio necessário poderíamos ter, então, a situação em que um dos réus dessa reconvenção é o autor - então, ele é reconvindo - porém, o seu litisconsorte necessário, que seria o segundo réu, ele não figura na demanda. E, conseqüentemente, pela dicção do art. 315, não poderia ser em face dele proposta uma respectiva medida.
Ora, sobre esse aspecto, nós temos alguns autores, com por exemplo, o Cândido Dinamarco, que admitem, mesmo assim, a possibilidade de manejo da reconvenção, porque bastaria que tomássemos em relação ao réu da reconvenção, autor do processo primeiro, do processo principal, essa ação como reconvenção e entendéssemos que esse mesmo pedido sob o aspecto do litisconsórcio necessário ensejaria que esse segundo réu figurasse no pólo passivo, mas em relação a ele, obviamente, essa demanda não é uma demanda reconvencional, mas sim uma demanda autônoma. De modo que seria possível aí compatibilizar reconvenção e litisconsórcio necessário.
Nessa medida então temos que compreender a dicção do art. 315 - reconvir ao autor - com as ressalvas devidas, percebendo que ele, autor, será o reconvindo, mas isso não inibe que outras pessoas, que não estão na primeira demanda, figurem no pólo passivo dessa reconvenção.
- A minha pergunta é como ficaria essa situação, uma vez que há divergência entre os autores, como ficaria a situação, num caso de litisconsórcio, desse primeiro, que começa a ação, ele seria o reconvinte, e o segundo que fazia parte da demanda, seria uma ação autônoma para um e a reconvenção para o outro?
- Vamos compreender a reconvenção em essência. A reconvenção, na verdade, é uma oportunidade processual que se estabelece por duas razões. Primeiro, porque no rito ordinário eu não tenho a possibilidade de pedido contraposto, como no rito sumário. No rito sumário eu tenho a possibilidade de pedido contraposto, como nos procedimentos especiais. Ex.: eu posso em ação possessória pedir a meu favor, mesmo que eu seja réu na ação possessória. Ora, então o rito ordinário como ele não se presta a permitir um pedido contraposto, cria-se a oportunidade, cria-se um mecanismo apartado. E que mecanismo apartado é esse? Ora, a reconvenção: no prazo para a contestação, eu vou manejar a respectiva reconvenção.
E um segundo motivo, que nós temos para perceber que isso é uma oportunidade processual, diz respeito à autonomia da reconvenção. Ou seja, a reconvenção é uma acão autônoma, paralela em sentido contrário. Ora, se ela é uma ação autônoma, paralela em sentido contrário, cuja razão ensejadora, o próprio art. 315 nos coloca aqui o aspecto da conexão, a conectividade entre as respectivas demandas, nós vamos observar que esse pedido formulado em reconvenção na verdade também pode ser realizado em uma ação absolutamente autônoma e disposta, inclusive, em juízo apartado. Nessa medida, é um apego gramatical, que me parece exagerado - e nesse ponto, eu concordo com Cândido Dinamarco - a dicção gramatical da norma. Porque basta que você leia essa oportunidade em relação ao autor/reconvindo como verdadeira reconvenção, e leia, ao segundo réu da reconvenção, que ele não figura na primeira demanda, leia essa oportunidade processual como uma ação autônoma. Ou seja, enquanto que um é reconvindo o outro é verdadeiramente e exclusivamente réu. E a razão disso? A razão disso é a economia processual, é uma oportunidade que se estrutura e edifica em razão da economia processual. De modo que não me parece de todo absurdo essa posição do Cândido Dinamarco, mas sim, do contrário, apresenta uma razoabilidade e uma melhor adequação à questão ligada à economia processual. Agora, sem dúvida nenhuma, você vai encontrar outros autores, como você mesmo citou, o Humberto Theodoro, que não aceitam essa possibilidade. Já por exemplo, o Marinoni, aceita essa possibilidade. Na verdade ele não é muito explícito sobre isso, ele não declara cabalmente esse aspecto. Mas, o Marinoni, em seu Manual sobre o Processo de Conhecimento, da RT, você pode observar que quando ele trata, quando ele versa sobre o assunto reconvenção, ele desenvolve algumas posições das quais infere-se que ele concorda com essa posição. Ele não se posiciona explicitamente, mas pelos argumentos desenvolvidos, você percebe que há alguma simpatia, alguma concordância sobre essa posição.
Agora, realmente, se você for fazer uma interpretação mais gramatical da norma, não seria possível isso.
- Se esta na mesma ação, como podemos dizer que é autônoma?
- Eu não posso confundir o instrumento, o veículo, eu não posso compreender o meio ou o modo pelo qual eu faço alguma coisa, com a essência daquela questão, com a coisa em si. Exemplo: quando você pega um contrato de locação, normalmente o que você tem? Cláusula Primeira:....; Cláusula Segunda:....; Cláusula Terceira:...etc. Aí vem lá uma determinada cláusula - a da fiança. Na outra página, assina o locador, assina o locatário, assina o fiador e as testemunhas, correto? Ora, o instrumento aqui é o mesmo, mas eu, em verdade, estou tendo o quê? Dois contratos: eu tenho aqui o contrato de locação, e tenho o contrato de fiança. Estão sendo celebrados no mesmo instrumento dois contratos. Então eu não posso olhar para o instrumento e querer do instrumento extrair a natureza jurídica, porque aqui nesse instrumento de contrato eu tenho, na verdade, a celebração de dois contratos: um contrato do locador para com o locatário, e um contrato do fiador para com o locador. Vamos observar que não é o fato de o instrumento, que é a petição inicial, da reconvenção receba esse nomem iuris, receba essa nomemclatura, eu não tenha nessa oportunidade a possibilidade de tomá-la ao mesmo tempo de modo cindido. Ou seja, eu tenho no mesmo instrumento um pedido formulado em face do autor reconvindo e tenho um pedido formulado em face de um respectivo réu. Então, aqui é uma questão de um instrumento e substância. Nesta medida, o Cândido Dinamarco e o Marinoni desenvolvem lá os seus argumentos. Agora, volto a frisar, a observação de quem não admite essa hipótese é também razoável. Eu estou simplesmente me referindo ao fato de que essa outra posição - a de inadmissão disso - é uma interpretação mais apegada a uma gramaticidade, a uma interpretação mais literal e menos sistemática, digamos assim. Está claro? Compreendeu a questão sob esse outro enfoque?
Prosseguindo, então, a análise do art. 315: O réu pode reconvir ao autor no mesmo processo, toda vez que a reconvenção seja conexa...” Aqui nós precisamos pensar um pouco nessa conexão, porque nos diz aqui a temática, quando trata da conexão, nos diz que seja conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa. Ora, aqui precisamos pensar, então, que essa conexão, na verdade, precisa ser entendida lato sensu. Talvez o Código tenha utilizado aqui a expressão conexão na ausência de outra melhor. Por que quando falamos em conexão nós temos que nos lembrar do art. 103:
Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir.
Ora, então, nós temos a questão do art. 103 ligada à combinação dos elementos da demanda. Aqui, mais uma vez, nós caímos na conhecida questão dos elementos da ação:

partes


causa de pedir ➚ próxima
➘ remota


pedido.➚ mediato
➘ imediato

Então nós vamos poder verificar que, a partir do momento que eu tenho a combinação de um desses elementos, causa de pedir ou pedido, eu tenho a conexão. Mas a conexão, na verdade, se formos analisar, não é isso que está escrito no art. 103. Por que? Porque se fóssemos fazer uma interpretação gramatical do que está disposto no art. 103, nós chegaríamos a uma conclusão absurda, porque, por exemplo, toda e qualquer ação que pedisse danos morais seria conexa. Ora, como no Rio de Janeiro nós temos milhares de milhares de milhares de ações que pedem danos morais, nós teríamos todas essas ações conexas. O que é uma conclusão absurda. Chegamos, pela interpretação gramatical, a uma interpretação absurda. Ora, assim devemos pensar em outras hipóteses, em outros caminhos para compreendermos o art. 103. Na verdade nós temos conexão quando existe a possibilidade de que uma ação venha a influir na outra. O resultado de uma venha a influir no resultado da outra. Em função de ter a causa de pedir comum, ou em função de ter o pedido comum. Assim sendo, nós vamos observar que a conexão é mais um mecanismo, ao lado de vários outros, que tem por objetivo último, então, o quê? Evitar decisões contraditórias. Porque ao reputarmos conexas duas causas, nós poderemos ter a reunião dessas causas e, conseqüentemente o julgamento simultâneo dessas causas.
Então, relembrada a questão ligada à conexão, nós temos agora de raciocinar esse conceito à luz do art. 315.
Na verdade, dizem alguns autores, quando pensamos em reconvenção nós estamos diante de uma resposta. Resposta essa que deve guardar relação com o fundamento da defesa. E o que significa guardar relação com o fundamento da defesa? A ingressa com uma ação em face de B, reclamando danos morais, danos materiais, em face de uma relação contratual, e a quebra desse respectivo contrato. Nessa medida, B promove uma reconvenção, porque há algum tempo atrás, numa relação locatícia que se estabeleceu, entre A e B - algo que nada tem a ver com esse contrato, pois o contrato discutido na ação de A, é um contrato de fornecimento de alguma mercadoria - e a relação locatícia de um determinado galpão, para a estocagem de depósito; ou seja, um outro contrato, com outro objeto, com outra relação jurídica, algo completamente diverso; B, então, propõe a discussão desse novo assunto em reconvenção, é possível? Não, não é possível, porque eu não tenho nenhuma ligação com o fundamento de defesa. Ou seja, eu tenho de compreender que a necessidade de desenvolvimento de argumentos em sede de reconvenção que guardem relação, que guardem de algum modo, de alguma forma um modo de repercussão dessas esferas jurídicas, ligadas pela, digamos assim, identidade de alguns elementos no curso dessa causa de pedir ou desse pedido. Vale dizer, então, na verdade, que eu preciso de identidade de determinados pontos ou questões no processo. A reconvenção ela não é, pura e simplesmente, uma oportunidade autônoma, em absoluto. Ela é autônoma, mas autônoma entre aspas, ou seja, o próprio art. 35 já começa a nos deixa claro que eu preciso de algum modo de uma conectividade, eu preciso de algum modo de alguma ilação, de algum laço de interdependência entre aquilo que se discute na reconvenção e aquilo que se discute na ação principal. Porque do contrário, os pedidos não se interrelacionam, e o assunto deve ser tratado numa ação apartada que não gera nenhuma conexão, não gera prevenção, não gera vinculação de qualquer sorte entre as demandas. Então, nós temos de pensar aí nessa questão ligada à conexão e a dicção que deve ser entendida a conexão aqui no dispositivo, bem como a oportunidade, ainda, que coloca a temática do art. 315, na parte final do dispositivo, como fundamento da defesa. Ora, se eu preciso, necessariamente, ter esse fundamento da defesa, significa que a causa de pedir está sendo aí o centro desse debate, porque a divergência entre as partes diz respeito às conseqüências jurídicas da própria dinâmica dos fatos entre as partes. Ou seja, enquanto que A entende que aquele conjunto, aquela causa de pedir origina, em face de B, a possibilidade de um determinado pedido; B, ao seu turno, está enxergando nessa gama de fatos e naqueles em que temos o acréscimo do aspecto reconvencional, ou seja, nesse conjunto de fatos e fundamentos, mais aquilo que B carreia ao processo, B alega e demonstra no processo, coligiriam para ele a conseqüência jurídica diversa, possibilitando que ele, B, faça o seu pedido, formule o seu pedido. Então, nessa esteira, o art. 315 deve ser compreendido sob esse conceito amplo, sob esse conceito lato, até porque temos que ressaltar que uma resposta, uma contestação não tem causa de pedir e nem tem pedido stricto sensu falando. Ora, então, se ela não tem pedido stricto sensu falando, na verdade o conceito puro e simples de conexão aqui seria um conceito tecnicamente equivocado. Ou seja, o que nós temos aí é uma conexão, mas isso num sentido bastante lato. Talvez para não desenvolver uma nova dicção, sob pena de isso gerar o desenvolvimento de confusões, tenha o legislador colocado aqui a expressão conexão sem maiores preocupações.
Vamos observar que, como tínhamos lido no art. 299, a reconvenção, em linha de princípio, se dá de modo simultâneo e com peça apartada. Então, o réu pode reconvir ao autor no mesmo processo toda vez que a reconvenção seja conexa com a ação principal, ou como fundamento da defesa. Esses argumentos de reconvenção vão ser talhados em peça autônoma e simultaneamente, pelas questões que observamos na aula anterior, até mesmo sob pena de preclusão. Nós, volta e meia, nos deparamos com interpretações mais conservadoras, que, ao negarem a simultaneidade, concluem pela preclusão. Então, se eu vou contestar e reconvir que se faça isso de modo simultaneo. Se eu apenas vou reconvir - e isso é admitido pela doutrina e pela jurisprudência, que eu posso apenas reconvir, e não contestar - então, obviamente, isso se dá no prazo da resposta. Agora, o que não seria possível, segundo alguns, é apresentar a contestação, por exemplo, no décimo dia, e aí, no décimo quinto dia, apresentar a reconvenção. Por que? Porque se o art. 299 fala da simultaneidade, a apresentação da contestação teria o condão de provocar uma preclusão consumativa e temporal sobre a oportunidade reconvencional. Ou seja, se eu tenho uma oportunidade para a prática de determinados atos ou para uma gama de atos e eu pratico apenas alguns deles, do ponto de vista consumativo a oportunidade agora se encontra preclusa. E, além disso, em função dessa atividade consumativa, não haveria mais o aspecto temporal, porque o prazo estaria encerrado no momento de interposição da contestação. Claro que essa interpretação, mais uma vez, é uma interpretação apegada ao texto, à dicção gramatical do art. 299. Claro que nós temos várias outras interpretações sobre esse mesmo dispositivo, que descaracterizam essa simultaneidade, permitindo, então, como peças autônomas que são, como demandas autônomas que são o seu manejo independente. E, nessa medida, o material tanto doutrinário quanto jurisprudencial é significativo.
- Mas o prazo da reconvenção não é o mesmo da contestação?
- O raciocínio que se faz mais apegado à norma é justamente esse: o prazo é o da contestação. Ora, se eu contestei em dez dias e abdiquei dos outros cinco para contestar, a prática de outros atos neste período está preclusa. Tanto é que eu não posso aditar à contestação: contestar um pouquinho hoje, amanhã eu lembro de alguma coisa, contesto mais um pouquinho etc. Isso ia ser uma “beleza”, você já imaginou?! Ia ser muito bom, mas “infelizmente” isso não é possível. Então, faz-se, num apego mais gramatical, a leitura de que o art. 299 impõe que, feita a contestação, eu estou abdicando do meu prazo. Ora, se eu estou abdicando do meu prazo e a reconvenção deve ser interposta no prazo, isso significa, então, que esse prazo aqui estaria abdicado. Estando abdicado, eu não posso praticar um ato processual aqui. E como eu disse, aqueles que interpretam isso de modo mais flexível desenvolvem os seus argumentos em função da própria autonomia dessas demandas. A questão ligada à autonomia entre reconvenção e ação principal, tanto que podemos inclusive ter a extinção da reconvenção com a seqüência da ação principal, sem que exista aí prejuízo; e, o contrário também é factível: nós podemos ter, por qualquer sorte, a extinção da ação principal, e a continuidade da reconvenção. Ora, isso nos deixa claro, isso nos mostra que essas ações são autônomas e, conseqüentemente, com base nessa autonomia é que seria factível a prática da apresentação da contestação e da reconvenção em momentos autônomos. Ou seja, na verdade a simultaneidade do art. 299 não seria cogente, mas apenas e tão-somente uma disposição indicativa e não obrigatória.
Essas são as duas leituras.
Do ponto de vista prático é melhor você se esforçar para apresentar as peças simultaneamente, evitando, assim, as incertezas e inseguranças que podem advir nesse ponto.
Mais uma questão que havíamos comentado na aula passada é a questão da autonomia das peças. Você, tem a rigor, no art. 299, também a necessidade de realizar duas peças: a peça de contestação e a peça de reconvenção. Mas esse apego também gramatical à exigência de duas peças esbarra nas questões ligadas à teoria das nulidades possessórias. Ora, quando não há uma previsão de expressa nulidade, a cominação de nulidade não se impõe na própria norma processual, aquilo pode ser reputado como um vício sanável, e, conseqüentemente, temos vários doutrinadores e jurisprudências que entendem que, desde que seja possível reconhecer quais são os argumentos de contestação e quais são os argumentos da reconvenção, ou seja, aonde começa uma e aonde termina a outra, seria possível aproveitar essa disposição.
O parágrafo único nos dispõe:
Não pode o reú, em seu próprio nome, reconvir ao autor, quando este demandar em nome de outrem.
Vamos compreender isso, porque a dicção do dispositivo pode não ser a mais clara e gerar dúvidas.
Quando nós temos o parágrafo único dizendo que não pode o réu - eu, mais uma vez, estou debatendo legitimidade - em seu próprio nome reconvir ao autor, quando este demandar em nome de outrem. Ora, como demandar em nome de outrem? Vamos observar que o art. 6º, do CPC, nos coloca as regras gerais da legitimidade, e estabelece uma legitimidade ordinária e uma legitimidade extraordinária. Por que? Porque o art. 6º, do CPC, nos diz que não é possível que se pleiteie em nome próprio direito alheio - aí vem uma vírgula - salvo quando autorizado por lei. Vamos ler esse dispositivo para termos a exata dicção do Código:
Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.
Eu preciso compreender isso a contrario sensu, pois o dispositivo vem redigido a contrario sensu. Ora, se ninguém poderá pleitear em nome próprio direito alheio, significa que a regra geral é a de que só se pode pleitear em nome próprio. Ou seja, aqui eu tenho um dispositivo a contrario sensu, estabelecendo a regra geral, que é só posso pleitear direito próprio; não posso pleitear direito alheio. A primeira parte da frase nos dá essa regra geral a contrario sensu.
Quando a frase é virgulada e, após isso, é dito - salvo quando autorizado por lei - isso indica que, em algumas hipóteses, eu terei uma regra especial. E que regra especial é essa? Eu vou ter a autorização para que alguém que não é titular vá a juízo e pleiteie direitos. Ou seja, estou colocando nessa ressalva a regra especial. A primeira parte do dispositivo nos dá a regra geral; a segunda parte do dispositivo nos dá a regra especial. Isso origina aquilo que na doutrina se chama de legitimidade ordinária, legitimidade extraordinária. Então, eu tenho hipóteses em que alguém que não é o titular do direito, está indo a juízo para pleitear esses direitos.
E aí, então, nós vamos observar o quê? Eu tenho aqui uma questão ligada à substituição processual. Vamos lembrar que substituição processual é diferente de sucessão processual: são questões distintas. Substituição processual diz respeito a essa temática da legitimidade, ou seja, se eu sou legitimado ordinário ou se eu sou legitimado extraordinário. E a sucessão processual diz respeito ao modo pelo qual alguém ingressa em juízo substituindo a antiga parte. Ou seja, a parte original se retira, por qualquer motivo, e ingressa em seu lugar um novo litigante. Aqui ocorreu sucessão processual, porque o direito continua sendo um direito próprio, o legitimado continua sendo o legitimado ordinário. Imaginemos, por exemplo, que eu tenho o falecimento de uma de uma das partes. Ora, o falecimento de uma das partes faz com que o seu herdeiro ingresse na respectiva demanda. Ingressando na respectiva demanda, agora ele é um sucessor processual, porém, ele continua legitimado ordinário. Porque ele agora na posição de herdeiro, continuará no processo pleiteando direito próprio. Diferente, por exemplo, quando alguém vai a juízo propor uma ação civil pública, ou quando alguém vai a juízo, propor uma ação popular - quando o Ministério Público propõe uma ação civil pública, ou quando a OAB propõe uma ação civil pública, está indo a juízo como legitmado extraordinário. Por que? Porque o legitimado ordinário é toda a sociedade de modo difuso. O MP não está indo, ou a OAB não está indo pedir para si, mas para pedir para outrem. Daí porque ela está em juízo como legitimado extraordinário.
Ora, nessa medida, carreando tudo que dissemos para o parágrafo único, do art. 315, nós temos o que? O réu não pode em nome próprio reconvir ao autor quando este (quando este quem? O autor da demanda, que seria o autor/reconvindo) demandar em nome de outrem. Ou seja, se eu tenho A em face de B, e A está indo a juízo como um legitimado extraordinário, eu não posso ter B promovendo uma reconvenção em face desse legitimado extraordinário. Por que? Porque B deve propor a sua demanda em face de quem? Do titular, do legitimado ordinário. Ou seja, o pólo passivo deve ser sempre legitimado ordinário. O pólo ativo é que pode ser legitimado ordinário ou legitimado extraordinário. Mas o pólo passivo só pode ser legitimado ordinário, porque eu não posso pleitear de um substituto aquele direito. Imaginemos que, então, que o Ministério Público agindo numa legitimidade extraordinária propõe uma ação de investigação de paternidade em face de um indigitado pai. Ora, não pode este pai reconvir ao Ministério Público, pois este está ali como substituto processual. Daí porque a razão do parágrafo único, do art. 315.
- Esse legitimado extraordinário seria o Ministério Público, a OAB. Dê mais alguns exemplos de quem poderia estar nessa condição.
- Por exemplo, você veja como a sociedade regride! A sociedade regride de diversas formas. O Código Civil anterior era um Código sábio, porque propunha e disciplinava o dote. Você, além de viver um grande amor, recebia (o que é muito justo!) um montante de recursos para administrar. O Novo Código veio e extinguiu essa questão. Mas você tinha, na temática do dote, legitimidade extraordinária, porque o Código dizia que, apesar dos bens dotais pertencerem à mulher, a legitimidade, ativa e passiva, para a proteção dos bens dotais, pertenciam ao marido. Então, aqui, nessa hipótese, você teria, no antigo regime, no antigo sistema a legitimidade extraordinária. Em verdade, o dote já era questão superada desde 1962, no Estatuto da Mulher Casada, e, mais uma vez, reforçada a questão, na Constituição de 1988. Falamos, portanto, aqui, de questão jurídica já superada.
Mas, em tese, à exclusão dessa hipótese, as leis novas incluíram outras hipóteses de legitimados extrarodinários. Por exemplo, quando, no Novo Código Civil, temos o trato de alguns aspectos no âmbito empresarial, verificamos o que? Primeiro, vamos definir a legitimidade extraordinária, que era dividida em:
● extraordinária autônoma;
● extraordinária difusa;
● extraordinária supletiva;
● extraordinária concorrente.
A legitimidade extraordinária autônoma, como nós, foi superada, não sobrevive no nosso regime jurídico.
A legitimidade extraordinária difusa é a que você vai encontrar na ação popular, na ação civil pública, na ação declaratória de inconstitucionalidade.
A legitimidade extraordinária supletiva encontramos em todo e qualquer dispositivo jurídico que coloque de modo, digamos assim, sucessório o advento de legitimidade. Vamos refletir sobre o Novo Código Civil. O NCC prevê, no art. 1033, a dissolução de sociedade. O inciso V, do referido art., nos diz que a dissolução da sociedade se fará por perda de autorização. Ex.: ao cassaram a autorização para os bingos, teoricamente incidiria esse artigo: assim, perdida, a autorização de funcionamento teriam de dissolver. O que o próprio Código Civil estabelece? Se os sócios não propuserem a dissolução no prazo de trinta dias, surgirá para o Ministério Público a possibilidade de propor uma dissolução. Se o Ministério Público não propuser dentro em trinta (30) dias, surgirá para o ( agora me foge a dicção exata do Código) mas para a Autoridade Administrativa que tem o poder de fazer cessar a autorização, a legitimidade para a propositura da ação visando a liquidação. Então, você pode pensar o seguinte: se o Ministério Público propõe a sua ação no 29º, ele não é legitimado, porque a sua legitimidade é supletiva. A sua legitimidade só surge após esse 30º dia, no transcurso desse primeiro dia. O mesmo se diga da Autoridade Administrativa: se ela propuser nesse momento, ela não será legitimada. Porém, nesse momento subseqüente, de modo supletivo, surge a legitimidade para a Autoridade Administrativa.
No âmbito do Direito Societário, no âmbito das S/A, nós vamos observar que existe a possibilidade de que os sócios que componham mais de 5% do capital, promovam atos de defesa do capital, atos de defesa dos bens sociais, se os legitimados ordinários não o fizerem. E quem são os legitimados ordinários? O Presidente, porque a lei dispõe que o presidente representa ativa e passivamente a sociedade. Então, o legitimado ordinário é a própria sociedade, representada pelo presidente. Ora, o sócio, na Lei das S/A, está atuando como legitimado extraordinário supletivo, porque uma determinada medida de proteção dos bens sociais, que deveria ter sido tomada pelo legitimado ordinário, não foi tomada, fazendo, então, surgir para algum terceiro uma legitimidade supletiva. Isso temos em vários momentos no Código Civil. Não só na Lei das S/A, mas também na Lei de Falências (tanto a antiga, quanto a nova), quando observarmos a legitimidade para requerer falências, de modo que o sócio pode requerer a auto-falência da sociedade. Então, a rigor, o legitimado ordinário é a própria sociedade, dado que pessoa física e jurídica não se confundem. Porém, se a própria sociedade não propõe a auto-falência, surge, extraordinária e supletivamente, a possibilidade ao sócio de requerer a auto-falência.
Assim sendo, você tem, em vários momentos, não só o Ministério Público, não só a OAB, não só Sindicatos ou Partidos Políticos, mas também os particulares, em vários momentos da legislação tendo essa legitimidade extraordinária.
E a hipótese do dote foi obviamente, descartada.
- Quero só tirar uma dúvida. Há o prazo para responder, mas a pessoa está viajando. A procuração por instrumento público para o ato processual, feita no consulado, alguém poderá comparecer a essa audiência que não seja o próprio, ou correrá à revelia?
- Você diz sob o aspecto do depoimento pessoal da parte?
- Ele foi citado mas está viajando. Ele foi comunicado por telefone, mas não pode voltar para o Brasil. Ele, então, vai ao consulado, naquele país onde se encontra, faz uma procuração, manda para o.......
- Primeiro você tem de estabelecer algumas questões. Primeiro, de que rito você está falando. Se você estiver falando do rito ordinário a contestação é por escrito, ele não precisa estar no Brasil, ele pode até estar na China.
- Na audiência...
- Bem, mas então você não está falando, por exemplo, de revelia, porque a revelia, art. 31, é a não contestação. Precisamos, pois, depurar a linguagem para trabalhar corretamente as questões .
- Rito sumário...
- Bem, se aí eu não vou para o rito ordinário, eu vou para o rito sumário, eu preciso, necessariamente, apresentar a peça de contestação em audiência. Ora, mas o apresentar a peça de contestação em audiência não necessariamente tenha de ser ato personalíssimo. A rigor, você tem no Código a possibilidade de fazer este ato de resposta por intermédio de representante legal. Não há na letra da lei, em específico, algo que desabone isso. Mas aí você tem o aspecto prático: você tem de lembrar que determinara interpretações, determinadas jurisprudências não são feitas, não são pensadas para agasalhar as melhores hipóteses, e sim, para evitar processos. Você pode observar que, normalmente, no juizado se a parte não comparece pessoalmente, enviando representante, o que se faz no juizado? Extingue-se o processo. Isso tem amparo legal? Não, mas agindo assim coloca-se mais um processo na pilha do arquivo morto. Ou seja, temos de verificar que do ponto de vista da praxe as vezes você se depara com posições jurisprudenciais bizarras, que têm a única e exclusiva função o “desafogar”o Poder Judiciário. Eles gostam muito de falar isso. Claro, quando você chega às onze - claro que ninguém chega e já começa a trabalhar: você antes tem de tomar um café, ver com é que estão as dinâmicas dos seus e-mails, respondê-los etc., etc. Você estaria “preparado” para começar efetivamente a trabalhar ao meio-dia. Mas aí já está na hora de almoçar! Então, você sai para almoçar. Volta às duas da tarde, mas aí você, obviamente, está sonolento - pois ninguém é de ferro! E aí você trabalha - até - às quatro horas da tarde! Vejam só que pesado! É, como eles gostam de dizer - um trabalho sobre-humano! Então, é claro, que num ritmo de traballho “tão intenso”, você precisa se livrar dos processos. E uma das maneiras de se livrar dos processos, por exemplo, é não reconhecer a determinada prática de um ato processual, como esse por intermédio de representante. O que, a rigor da lei, seria possível.

SEGUNDA PARTE:

das questões ligadas ao recurso especial e ao recurso extraordinário você vai encontrá-las nos regimentos internos dos Tribunais Superiores, e não no Código. Daí também porque, no campo dos recursos, tem muita gente que elabora lá o seu recurso e aí depois tem o recurso inadmitido por ter desrespeitado questões regimentais ou do STJ, ou do STF. Assim sendo, esses são aspectos que precisamos sempre prestar atenção.
- Se você continuar, na certidão dessa pessoa vai sair lá.......Mas ele não vai receber o mesmo número: 2005.0001. Ele não vai receber uma numeração desse tipo, até porque reconvenção é apresentada dentro dos próprios autos do processo. Vai receber o número de um novo processo?
- Como se fosse uma exceção, não receberá tipo 1/A?
- No Tribunal carioca parece que “.../A”, se não me falha a memória.
- Mas aí seria uma exceção...
- Aliás, é /alguma coisa, agora, assim, de cabeça, não tenho certeza. A tecnicalidade de como o distribuidor está fazendo aqui no Rio. Até porque essas questões são cambiáveis. Você pode observar que no próprio âmbito do RJ, que o tipo de anotação feita pela Justiça Federal é diferente do tipo de anotação feita pelo TJ. Você pode observar também as questões ligadas à própria temática recursal como o distribuidor anota a própria temática recursal de modo diferente. Então a questão ligada a essa tecnicalidade como é que está o distribuidor aqui no TJ, eu até posso dar uma olhadinha, para ver como é que está sendo registrado isso atualmente e te dar uma resposta depois.
O art. 318 nos diz:
Art. 318. Julgar-se-ão na mesma sentença a ação e a reconvenção.
Então, nós já vimos que a incidência do art. 318 não necessariamente ocorrerá. Nós podemos ter, e o próprio Código deixa isso claro, a extinção da ação e o prosseguimento da reconvenção, ou podemos ter o prosseguimento da ação e a extinção da reconvenção. O modelo ideal desenhado pelo Código é que a ação e a reconvenção tramitem até que eu possa colocar uma decisão em ambos os processos, em ambas as demandas. E aí eu teria aqui uma sentença.
Mas aqui vale mais uma vez ressaltar a confusão que o próprio Código faz entre instrumento e essência. Do ponto de vista de instrumento é claro que, materialmente, eu estou diante de uma mesma sentença. O sujeito vai lá fazer a sua respectiva sentença,vistos etc., e vai tratar de todos os aspectos no corpo de uma única peça. Mas temos que pensar o que? Que isso aqui é um instrumento. Na verdade, eu tenho duas demandas - eu tenho a demanda do autor para com o réu, e eu tenho a demanda do réu reconvinte para com o autor reconvindo. Ora, então, na verdade, eu tenho duas demandas. Isso significa que, em essência, eu terei, na verdade, duas sentenças - materialmente em uma sentença só. Materialmente o mesmo corpo numerado, seqüencial, aonde se lança o texto da decisão. Mas é claro que, materialmente, nós estamos decidindo duas pretensões, nós estamos decidindo pretensões que são distintas. Isso aqui pode até não ter uma grande importância, mas é relevante que lembremos isso, porque se eu levar essa mesma temática para a sede dos recursos, e nós depararmos, por exemplo, com um recurso como o Embargo Infringente, nós vamos pensar a seguinte questão: quando eu falo num acórdão, este materialmente é um só. Mas cada assunto que está sendo decidido pode ser impugnado especificamente. Imaginemos, então, que em um acórdão, proferido pela Terceira Câmara, decida-se dano moral, dano material e lucro cessante. Aqui, no dano material, foi 3 X 0; aqui, no dano moral, 3 X 0; mas no lucro cessante, foi 2 X 1, sendo que nós temos a alteração no que se refere à decisão anterior e, conseqüentemente, com base no voto divergente, eu posso propor os embargos infringentes. Mas aí você faz o quê? Você não propõe os embargos infringentes e maneja logo o seu recurso especial. Manejando o seu recurso especial você vai ter a decisão do recurso especial pela inadmissão. Por que? Porque vai vir uma decisãozinha, mais ou menos assim: “o recorrente não esgotou todas as vias jurisdicionais, razão pela qual incabível manejar o recurso especial nessa hipótese. Ou seja, você não manejou o infringente e ainda teve obstaculizado o seu especial. Isso é um único acórdão que está decidindo vários assuntos. Vale, então, mais uma vez: eu nunca posso confundir o instrumento com a essência. Do ponto de vista da essência, eu estou prolatando duas sentenças num mesmo instrumento. Assim como o acórdão, materialmente, um único acórdão, mas cada decidido é, na verdade, um acórdão de per si, que estão materialmente colocados num conjunto seqüencial e numerado aonde foram lançadas as informações dos acórdãos. Então a noção de instrumento e essência começa a ganhar mais relevo quando você tem esse tipo de questão. Ou quando você começa a se interessar, por exemplo, nas questões ligadas à devolução, aquilo que está sendo devolvido ao tribunal, tanto na sua profundidade, quanto na sua extensão. Nós já falamos aqui um pouco no art. 515, por isso não vamos tocar novamente nessa questão, mas são todas as repercussões de uma única temática e que se o advogado não prestar atenção a isso, pode, obviamente, ter prejuízo. E mais uma vez, cabe aqui lembrar que do ponto de vista da praxe o Estatuto da Ordem assegura a intervenção sumária em qualquer julgamento. Por que? Porque nós temos que lembrar que a boa votação, a boa colheita de votos, item a item, é extremamente importante. Porque se na hora da sessão no Tribunal, na qual há sempre aquela bagunça, eles não prestam atenção em absolutamente nada do que estão julgando, e aí você se depara com uma má colheita de votos, isso pode inviabilizar, por exemplo, o manejo do embargo infringente, porque muitas das vezes, os assuntos acabam, ao invés de receberem voto a voto, receberem uma única votação. E cabe, então - e é direito do advogado - intervenção sumária para exigir votação item a item. E mais: a questão da votação deve ser separada, no que se refere ao conhecimento, do provimento, porque eu tenho, além das questões meritórias do recurso, eu tenho antes de ter tido uma votação relativa ao conhecimento, e o conhecimento pode ter sido dado por 2 X 1. Então, podemos ter a seguinte hipótese: você ganha no mérito. Temos lá um acórdão discutindo apenas um assunto: dano moral: 3 X 0. Aí você pensa: não, não cabe infringente. Mas a boa votação tem de ser colhida do voto de conhecimento, e o conhecimento pode ter sido 2 X 1. Então, na verdade, do conhecimento cabe o manejo do infringente em relação ao conhecimento, e aí quando você for para o julgamento do conhecimento, no infringente, você pode ter, por exemplo, daquele resultado que fora 2 X 1, ficar, agora, 2 X 3 - aqueles dois mantém o conhecimento, mas a ampliação do Colégio faz com que o não conhecimento vingue, e aí aquilo que você tinha ganhado no mérito, vai por água abaixo. Porque o infringente foi manejado sobre a base do conhecimento. Agora, se você na sessão não fez as intervenções sumárias e não exigiu que os votos fossem coletados como determina o próprio Código de Processo, é possível que você não possa manejar isso aqui: houve lá um debate oral, um divergiu do outro em relação ao conhecimento e aí vem que por unanimidade negou-se provimento do recurso. Tudo bem - no mérito -, mas no conhecimento foi 2 X 1, então tem que fazer constar lá. E se foi 2 X 1 você pode, no conhecimento, manejar isso isso aqui.
- No conhecimento, você diz na hora?
- Intervenção sumária, você está ali na sessão.
- Já que se está tocando nesse assunto, fale para nós como é que deve ser feito isso para que o desembargador não mande você calar a boca.
- O Estatuto da Ordem assegura intervenção sumária. Então, você inicie - Excelência, pela ordem - a dicção do Código é essa, que você utilize a expressão “pela ordem”, seguindo-se a sua observação. Assim como para esclarecer uma questão de fato. Se os desembargadores estão debatendo, e você percebe que a questão fática está errada, eles não estão debatendo a questão fática errada, você pode intervir dizendo: Excelência, pela ordem, a questão fática não é essa - e faça o seu esclarecimento.
- Já vi algumas vezes uma situação semelhante e o desembargador dizer: doutor, estamos votando, não cabe mais o senhor participar...
- Cabe, cabe: excelência, os senhores estão votando, mas a Lei Federal me permite e me assegura o esclarecimento de questões fáticas a qualquer momento do julgamento. Isso é o Estatuto da Ordem. Então, se Vossa Excelência não permite que eu esclareça a questão fática, que faça constar em Ata. Porque o Estatuto da Ordem te assegura a intervenção sumária em qualquer julgamento para esclarecimento de questões de ordem fática. Vamos ao Estatuto da Ordem.
Capítulo II - Dos Direitos do Advogado
Art. 7º. São direitos do advogado:
.................
X - usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas.
Os advogados não utilizam porque não sabem seus direitos.
- Isso vale para juízado especial...?
- “Em qualquer juízo ou tribunal”.
- Porque o que vemos é exatamente o contrário. Abre prazo para a sustentação, se você recusa, eles não permitem qualquer interferência.
- ............
- Isso é Lei Federal. O grande problema é que a nossa classe é tão desgraçada que a Lei Federal - vamos repetir: hierarquia das normas, lei federal, Constituição, art. 59: Constituição Federal, lei complementar, lei ordinária etc. Portaria de juiz não está nem elencada aqui; puxa-saquismo de sub-carimbador também não está elencada aqui. E aí nós nos deixamos barrar pelo sub-carimbador. Bem, qual é o assunto, eu vou despachar com você? É você que vai decidir? Ele pode dizer: ah, é que não pode falar. Responderemos: a Lei Federal me deixa falar. Por que? Porque o Estatuto da Ordem não é algo interna corporis - é lei federal - e como lei federal nos diz em seu art. 7º, X, que podemos nos dirigir diretamente aos magistrados. Então eu não preciso despachar com ....
- E se ele não te der licença?
- Independentemente de licença: ele tem que lhe receber nem que seja para ficar olhando para a sua cara e depois perguntar: já acabou, doutor? Já, já acabei. Muito obrigado: esclarece e vai embora. O problema é que nós no dia-a-dia nos deixamos barrar pelo sub-carimbador, nós nos deixamos barrar pelo assessor do sub-carimbador. Então, é a lei que me permite: o juiz tem de me receber, nem que seja para ficar olhando para a minha cara, esperar eu terminar de falar e....
- .............
- Só então para concluir, está claro a expressão “pela ordem”, porque e quando se pode utilizar e como é lei federal que te assegura? Claro e óbvio, a questão é sempre tensa, ninguém está negando isso, há necessidade de uma dose de calma para essa intervenção. Agora, saiba que você está plenamente escorado em lei federal e, conseqüentemente, qualquer negativa disso é ato de coação, ele estará sendo, naquele momento, autoridade coatora.
- Mestre, na hora de despachar o juiz diz: não, não atendo a essa hora. Isso é normal?
- Normal é, mais aí também temos, mais uma vez esse aspecto que nós estamos falando: a lei federal te assegura, mas, é claro, que aí entra um pouco do aspecto da sensibilidade, do próprio exercício da prática, porque, por exemplo, muitas vezes é melhor você ser recebido com um pouco mais de calma e num momento em que o magistrado já desafogou um pouco a sua agenda, do que você querer forçar isso. É aí que entra um pouco, também, do bom senso: quando vale a pena brigar. O importante é sabermos que a lei assegura determinadas questões, porque em determinados momentos se pode aguardar; em outros momentos, é uma questão de urgência. Como é a questão do julgamento: ele está sendo julgado ali, naquele momento; se você não esclarecer, naquele momento, adeus, porque vai ter sido julgado. Agora, num despacho, se você pode aguardar um pouco, ir resolver outras no Fórum, para voltar mais tarde, você não vai brigar à toa. Agora, se for urgência urgentíssima, que você tenha que despachar, então faça valer aquele direito que a lei federal lhe confere. Se o advogado não se impuser nesse momento, então,...
Vamos exemplificar isso de modo claro: quando o magistrado permite o desenvolvimento de um diálogo fácil, isso é tranqüilo; mas tem certos magistrados, vamos dizer a maioria, quando recebe marca horário: vem depois das quatro, vem depois das três e meia, enfim. Você comparece lá e, tudo bem, não vai ficar brigando, sendo o paladino do mundo. Eu, na semana passada, tive um mandado de segurança na Justiça Federal e, que pleiteávamos a questão do depósito recursal. Depósito recursal que pode ser substituído por arrolamento de bens. Ora, o órgão havia-nos negado o arrolamento de bens, isto é, aceitado única e exclusivamente o depósito. Então se ingressou com um mandado de segurança para que fosse deferido o arrolamento. O prazo do recurso administrativo, o recurso voluntário (é a linguagem administrativa) vencia-se naquele dia e se não despachássemos naquela hora em específico, o prazo do recurso ia se vencer e aí eu correria o risco de ter uma decisão, mas agora já ser o recurso considerado intempestivo. Assim sendo, eu tinha que obter a decisão naquele momento. Claro que para ele a decisão juridicamente não é singela porque a jurisprudência e a doutrina majoritariamente acolhem a tese. Então, do ponto de vista jurídico, era algo simples. A questão é que, na Justiça Federal, em 99,9% dos casos, você não consegue falar com o magistrado. Então, obviamente, houve uma situação relativamente tensa, mas, felizmente, se conseguiu. Agora, se você não conhece o seu Estatuto, não essa possibilidade, na sua prática de advogado você deixa algumas situações passarem por intimidação.
- Posso citar um exemplo um exemplo que aconteceu ontem na Segunda Vara Cível de Madureira? Eu estava na fila e tinha uma senhora dentro da serventia. De repente veio o juiz lá do gabinete dele, chegou na serventia, viu aquela senhora e perguntou: a senhora é advogada? Por favor, pode se retirar. Ela respondeu que fora convidada por alguém para vim esclarecer. Ele insistou: não, mas fique lá fora, não fique aqui na serventia. Ela saiu, chateada, mas não falou nada para o juiz. Aí o juiz passou à sala ao lado. Aí ela começou a falar com os outros colegas: imaginem, me expulsar. O juiz ouviu, voltou e disse que não a havia expulsado e que estava apenas obedecendo ao Provimento da Corregedoria.
- Você tem direito a atravessar as cancelas...
- Pois é, aquele provimento. E ela não falou nada. Mas aí, depois, ela respondeu que ele poderia obedecer ao Provimento e ser mais delicado. Aí ele disse que havia sido delicado e aí começou aquele bate-boca. Mas exatamente por não ler o Estatuto ...
- Sim - lição que aprendemos na cadeira de Introdução - eu não posso revogar Lei Federal por provimento. Se a classe estudasse mais, seria mais respeitada. Para que concluamos esse tema, vamos observar que o art. 318 me coloca a questão de ação e reconvenção sendo decididas por essa mesma sentença. Quando eu tenho essa situação:
Ação --------------------------|
Reconvenção --------------------------| eu não tenho nenhum problema porque o recurso a ser manejado é o recurso de apelação.
As situações mais complexas se referem a esse tipo de situação aqui:
Ação ---------------|
Reconvenção --------------------------|

Ação --------------------------|
Reconvenção -----------------|
Porque o art. 318, que está me dizendo que ação e reconvenção são decididas por sentença, o que implica em dizer, então, que, na verdade, a reconvenção, assim como a ação, em outras situações, em situações em que as decisões seriam diversas, mesmo assim isso seria uma sentença.
Ou seja, quando eu aqui
Ação --------------------------|
Reconvenção -----------------| decido que é inepta a respectiva reconvenção, essa decisão é uma sentença.
Assim como o mesmo se diga aqui
Ação --------------------------|
Reconvenção --------------------------| é uma sentença.
O mesmo se diga aqui
Ação ---------------|
Reconvenção --------------------------| é uma sentença.
Só que aí nós agregamos um complicador que é o fato de que elas estão nos mesmos autos. Ora, se elas estão nos mesmos autos eu não poderia manejar aqui
Ação --------------------------|
Reconvenção -----------------| a apelação. E por que não poderia? Porque a outra demanda continua o seu fluxo, razão pela qual a doutrina e a jurisprudência entendem que quando ocorre um encerramento fora da hipótese do art. 318, ou seja, fora do julgamento conjunto, quando for a hipótese de encerramento anterior da ação, ou de encerramento da reconvenção o recurso cabível seria o recurso de agravo. Utilizem o agravo enquanto ele ainda existe, pois os projetos em tramitação no Congresso têm a intenção de acabar com o Agravo. Utilizem o embargo de declaração enquanto ele ainda existe, porque os projetos em tramitação também acabam com o embargo de declaração.
E várias outras questões que eu acho que todo e qualquer que esteja militando deve entrar no site da Câmara e dar uma olhadinha nos projetos. Vocês vão ficar efetivamente de cabelo em pé ao verem as reformas que vêm por aí. São reformas altamente autoritárias. Entrem no site da Câmara e dêem uma olhadinha porque vem chumbo grosso por aí.
Um grande abraço, até semana que vem.

Comments:
Olá. Tenho uma dúvida no que respeita a alguns efeitos da reconvenção ou do pedido contraposto. Ocorre algum efeito preclusivo (material, digamos), se não forem usados? Vou exemplificar para ilustrar: digamos que alguém ajuíza uma ação pleiteando reparação de danos ocorridos num acidente de trânsito. A parte não apresenta pedido contraposto (nesse caso não cabe reconvenção, em virtude de o rito exigido ser o sumário). Julgada a ação, pode a outra parte ajuizar outra ação, pleiteando aquilo que deixou de fazer no pedido contraposto? E, se a resposta for afirmativa, como se comporta a questão da litispendência ou conexão, por exemplo, se a parte apelou da primeira decisão?
 
Postar um comentário

<< Home

Powered by Blogger